sábado, 15 de outubro de 2011

VIANA DO ALENTEJO












Viana do Alentejo é uma vila portuguesa, no Distrito de Évora, região Alentejo e subregião do Alentejo Central, com cerca de 2 800 habitantes.
É sede de um município com 393,92 km² de área e 5615 habitantes (2001), subdividido em 3 freguesias. O município é limitado a norte pelo município de Montemor-o-Novo, a nordeste por Évora, a leste por Portel, a sueste por Cuba, a sul por Alvito e a sudoeste e oeste por Alcácer do Sal.
Outrora foi conhecida como Viana a par de Alvito.

Freguesias

As freguesias de Viana do Alentejo são as seguintes:
Aguiar
Alcáçovas
Viana do Alentejo

População

1801 – 1.298
1849 – 3.493
1900 – 5.065
1930 – 7.814
1960 – 9.237
1981 – 6.188
1991 – 5.720
2001 – 5.615
2004 – 5.639

Património
Castelo de Viana do Alentejo
Igreja Matriz de Viana do Alentejo






HISTÓRIA

É sede do concelho e uma vila de extraordinária importância na história de Portugal. Desempenhou sempre um papel de destaque na defesa estratégica do nosso território.
O povoamento é muito remoto. O arqueólogo José Leite de Vasconcelos, que estudou o local nos inícios deste século, descobriu uma série de vestígios arqueológicos, que poderão ser atribuídos à época romana. Restos de cerâmica, algumas moedas e mesmo uma necrópole romana com as respectivas inscrições nas cercanias do local onde se encontra hoje o santuário dedicado a N.ª Sr.ª d’Aires. Aliás, o próprio lugar de Paredes parece querer indicar que ali existiu algum tipo de muros, muito provavelmente castrejos. Alguns autores, são da opinião que este templo cristão sucedeu directamente a uma ermida do paganismo hispano-romano.

Devastada pelas algariadas mouriscas, a vila foi repovoada no século XIII por D. Gil Martins e sua mulher, D. Maria Anes. Em 1269, encontramos um documento sobre a vila, em que D. Martinho, Bispo de Évora, reconhecia ter direito apenas a um quarto dos dízimos da "igreja de Fochem". Por morte de D. Gil Martins e sua mulher, passou Viana do Alentejo para a posse do seu filho, D. Martim Gil de Sousa, Conde de Barcelos.

Foi no reinado de D. Afonso III que lhe foi concedida a primeira carta de foral, mais tarde renovada por D. Dinis (1321) com privilégios iguais aos de Santarém. Foi também D. Dinis que lançou as bases para a construção do seu castelo, iniciada em 1313, e a elevou à categoria de vila. Fazia parte do seu termo Alvito, Vila Nova, Vila Ruiva e Malcabron. Os seus moradores recebiam 1000 libras de ajuda para levantarem as muralhas. A extensão do termo de Viana durante o reinado de D. Dinis era muita significativa, já que ia até Vila Alva, na época Malcabron, que se encontra actualmente no concelho de Cuba.


NOSSA SENHORA D'AIRES






A romaria de Nossa Senhora d'Aires, em Viana do Alentejo, distrito e arquidiocese de Évora, remonta a 1748, quando se iniciou o culto mariano deste local situado nas imediações da vila de Viana do Alentejo. Tudo terá nascido de um voto feito por alguns comerciantes (devido a uma epidemia que então grassava na região). Uma vez atendido o voto, de imediato se iniciou a construção do imponente santuário que hoje é o palco desta romaria.

Feira de Nossa Senhora d'Aires

A romaria principal é mais propriamente uma feira, com origem no alvará de D.José, datado de 27 de Setembro de 1751, que autorizou a realização de uma feira franca nesta local. A feira/romaria ocorre no quarto domingo de Setembro, quando se faz uma pequena procissão com a imagem da Virgem em redor do templo (onde se encontram inúmeros ex-votos).

Romaria a cavalo

A romaria a cavalo tem como objectivo a recuperação de uma tradição abandonada há cerca de 70 anos, quando os lavradores e agricultores se deslocavam com os seus animais ao Santuário de N. Sra. d'Aires para pedir protecção para o gado e boas colheitas. A Romaria a Cavalo realiza-se, no quarto fim-de-semana de Abril, entre a Igreja de Nossa Senhora da Boa Viagem, na Moita do Ribatejo, e o Santuário de Nossa Senhora D’Aires, em Viana do Alentejo. A romaria é realizada pela antiga canada real, conhecida, igualmente, pela estrada dos espanhóis e que perfaz um total de 120 km. Esta romaria tem um carácter religioso associado, sendo a Virgem transportada na romaria.
Na primeira edição, em 2001, a romaria contou com a participação de cerca de 200 romeiros.


Elementos recolhidos na Wikipédia

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

POESIA




(POESIA EM DÉCIMA. Para quem não sabe: estilo de poesia alentejana em que há um mote, e
um desenvolvimento em estâncias de dez versos em que o último vai reproduzindo cada um
dos versos do mote, pela sua ordem)
EM OLIVENÇA HOUVE FADOS
DÉCIMAS

Mote

Em Olivença houve fados/
na Rua dos Saboeiros;/
sentimos-nos recompensados/
entre tantos companheiros//

1
Dia vinte e dois de Julho/
do ano de dois mil e dez,/
entre cervejas e cafés/
lá findou todo o barulho./
E foi então, com orgulho/
que se escutaram os brados/
de músicas e dedilhados,/
porque nessa noite notável/
naquela artéria venerável/
EM OLIVENÇA HOUVE FADOS!//

2
Foram logo quatro fadistas/
que, com todos os seus dotes,/
desenvolveram os seus motes/
mostrando ser bons artistas./
Com expressões intimistas/
lá cantaram, altaneiros,/
de rostos sempre faceiros/
para quem os estava ouvindo/
em momentoas de gozo infindo/
NA RUA DOS SABOEIROS.//

3
Muito brilhou o Jorge Goes/
e também o João Ficalho;/
a Marlene foi o borralho/
com o calor dos seus bemóis/
que soaram como crisóis./
A Soraia fez agrados/
com seus belos trinados./
Depois de a todos ouvir/
com os corações a sorrir/
SENTIMOS-NOS RECOMPENSADOS.//

4
O Fado em casa se ouvia/
naquela noite tão morna;/
e da Pecorinha (*) à Corna (*)/
muita gente compreendia/
que uma nova era se abria./
Amanhãs mais verdadeiros,/
de mais indivíduos inteiros,/
no seu futuro mais crentes,/
oliventinos contentes/
ENTRE TANTOS COMPANHEIROS!

(*) Bairro de Olivença

Estremoz, 24 de Julho de 2010
Carlos Eduardo da Cruz Luna

OUGUELA



HISTÓRIA DE UMA ANTIGA VILA DO DISTRITO DE PORTALEGRE

HISTÓRIA DE OUGUELA

OUGUELA

-História e declínio de um Concelho-

Quem hoje se afasta de Campo Maior para norte, ou nordeste, encontra, a cerca de 10 quilómetros, uma povoação, Ouguela, de pouco mais de 60 habitantes. Um castelo de grandes dimensões, e que desde logo nos surpreende, domina a paisagem.
Trata-se de mais um caso de uma povoação que já teve alguma grandeza, e que conheceu um grande declínio, um pouco como sucedeu com Juromenha, e, em menor escala, com Terena, para já não falar de outras.
Algumas fontes antigas dizem que ali, existiu uma povoação romana chamada “Budua”, e que nos tempos visigodos, e até talvez árabes, se chamava Niguella. Não se sabe se há fundamentos para tais afirmações ou se estamos perante lendas.
Por volta de 1220 ou 1230, a região de Ouguela, bem como Campo maior, foi conquistada por leoneses. As duas localidades tornaram-se aldeias de Castela-Leão, com algumas situações de conflito sem grande importância, até que, em 1297, pelo tratado de Alcañices, passaram para Portugal, tal como, na região, Olivença (e Táliga). Ouguela (assim se passou a chamar) recebeu foral do mesmo tipo do de Évora, logo em 1298. Todavia, com Campo Maior e Olivença, dependeu do bispado de Badajoz até 1415. O castelo foi mandado reconstruir em 1300 (o que indica que já existia algo de fortificações no local, a não ser que se trate dum erro). Outras fontes indicam 1310, o que parece ser menos provável.
A importância de Ouguela, estava na sua posição estratégica, já que defendia um dos caminhos de entrada em Portugal, primeiramente conta Leão e Castela, depois contra a sua sucedânea Espanha.
Ouguela quase não é citada na crise de 1383-85, presumindo-se que terá sido anulada por Campo Maior, que se colocou do lado de Castela. Portanto, só terá regressado à coroa portuguesa entre 1348 e 1390. É muito possível que se tenham desenrolado combates na região, e que a população tenha sofrido com isso.
O seu castelo é várias vezes reforçado nos séculos XIV e XV, o que significa que mantinha a sua importância estratégica.
Em 1475, segundo a lenda e alguns documentos, ter-se-á travado um estranho combate singular entre João da Silva, alcaide-mor de Ouguela, e João Fernandes Galindo (Juan Fernández Galindo), alcaide-mor de Albuquerque (Espanha). Parece que um contigente castelhanho penetrara na vila. Ambos morreram dos ferimentos sofridos, tendo em 1551 Diogo da Silva, neto do alcaide-mor então falecido, a caminho do Concílio de Trento, mandado colocar no local de combate uma cruz comemorativa, hoje no museu de Elvas (Cruz de Galindo). Não se sabe o que haverá de fantasioso em tal episódio.
Em 1de Junho de 1512, Ouguela recebeu uma nova carta de foral (reinado de D. Manuel).
Claro que Ouguela, ou melhor, as suas gentes, terão participado na gesta dos descobrimentos iniciada no século XV, e terão vivido a decadência portuguesa da segunda metade do século XVI e do século XVII.
Em 1527, o numeramento (censo) de Portugal dava a Ouguela 144 fogos (cerca de 600 a 650 habitantes), ao lado de Campo Maior (cerca de 2900 habitantes), Alegrete (cerce de 1000 habitantes), Arronches (cerca de 3300 habitantes), Elvas (8900 habitantes), Olivença (4900 habitantes), Juromenha (600 habitantes), Terena (600 habitantes também), Vila Viçosa (3000 habitantes), Borba (3800 habitantes), Estremoz (4500 habitantes), Marvão (1700 habitantes), Monforte ( 2500 habitantes).
A guerra da restauração (1640-1668) levou novas agruras para a sua população. Datam dessa Época alguns troços de muralha com os primeiros trabalhos em 1647, mas que se estenderam pelo século XVIII.
Logo em 1642, Ouguela fora atacada, mas o exército espanhol não levara a melhor, conseguindo a vila resistir vitoriosamente. Um episódio semelhante ocorreu em 1644, mas aí os combates foram bem mais ferozes. A população resistiu com bravura, tendo várias lendas nascido na época.
Na memória popular ficou uma mulher, Isabel Pereira, que, segundo rezam documentos da época, se mostrou dotada de grande valentia, “quer pelejando nas trincheiras, [quer] repartindo pólvora e balas aos soldados; e retirada ao castelo ficou desacordada por algum espaço com a ferida que lhe deram, até que, tornando a si, e vendo que não era perigosa, prosseguiu a pelejar com maiores brios até ó fim”.
Em 1662, todavia, Ouguela rendeu-se sem resistência ao exército espanhol de D. João de Áustria. O capitão Domingos de Ataíde Mascarenhas, que deu a ordem de capitulação, foi depois severamente punido.
A paz de 1668 permitiu às terras raianas recomeçar a sarar as feridas, tanto do lado português como espanhol. Mas… novos conflitos se sucederam. Assim, em 1709 houve novas destruições em torno da vila, e em 1762 um rigoroso cerco, durante o qual o capitão Brás de Carvalho conseguiu resistir heroicamente.
Na obra “Corografia Portuguesa”, de 1708, de António Carvalho da Costa, tomo IF, duas páginas são dedicadas à vila de Ouguela; diz-se que a povoação tem mais de 700 habitantes, que o seu orago é Nossa Senhora da Graça, que tem casa da misericórdia na ermida do Espírito Santo. Mais, fala-se em ruínas antigas junto a uma ermida, são Salvador, a quatro quilómetros da vila, citada como tendo sido “Casa dos Templários”.
Diz-se ainda que Ouguela “é (…) abundante de pão, vinho, e gados, e [que] tem uma fonte com duas propriedades notáveis: uma, que toda a cousa viva, que se lhe lança dentro, morre logo, excepto rãs; e outra, que de maneira nenhuma coze carnes, nem legumes”. Mais, diz-se que a vila “tem dois juízes ordinários, vereadores, um procurador do concelho, um escrivão da câmara, um juiz órfãos com o seu escrivão, outro do judicial, e notas, e uma companhia de ordenança”. D. Pedro da Cunha, senhor de Tábua, é apontado como senhor de Ouguela.
A obra refere a lenda da igreja de Nossa senhora da Enxara, no caminho de Albuquerque, semelhante a tantas outras, nas quais uma divindade, ou uma estátua da mesma, indica o lugar onde se lhe deverá erguer um templo. Neste caso, é uma garota, e depois a sua mãe, que são escolhidas pela divindade. Descreve-se a imagem da Santa e opina-se que poderá ter origem visigótica. Refere-se que há muita devoção à mesma, e que pessoas de Campo Maior, e até de Castela, lhe pedem protecção, e visitam a Igreja.
É significativo, talvez, que não se refira a “lenda do tamborzinho”. Com as devidas reservas, tal poderá significar que esta, tão difundida em Ouguela, terá tido origem num facto ocorrido em 1709 ou em 1762. Dificilmente poderá ter tido lugar mais tarde.
A lenda diz que estando Ouguela cercada durante uma guerra (não se indica qual), e não sendo possível pedir socorro a Campo Maior, uma criança terá descido pela figueira que ainda hoje se vê junto á muralha, transportando uma bandeira e uma mensagem escrita, e talvez um tamborzinho com que costumava brincar. Não tendo levantado suspeitas no campo espanhol, ultrapassou as linhas inimigas e chegou a Campo Maior, entregando a mensagem no hospital. Diz-se que Ouguela terá tido um brazão inspirado nesta lenda, mas nada consta em documentos. Afinal, esta lenda reflecte a vivência de posto militar raiano das gentes de Ouguela.
Tudo isto terá influído no sentido de, em 1800, haver em Ouguela só 24 vizinhos “dentro” da vila e 20 fora (cerca de 200 habitantes, talvez). Em 1801, durante a Guerra das Laranjas, após a conquista de Olivença e Juromenha, Campo Maior rendeu-se ao exército espanhol, mas só depois de violento cerco e de muita resistência (15 de Junho). Ouguela não foi atacada, mas caída Campo Maior era um espinho nas costas do inimigo. 460 espanhóis, simulando um maior número pela disposição no terreno, aproximaram-se do castelo. O governador, Jóse Joaquim Queirós, acabou por entregar Ouguela ao atacante, já que não havia qualquer possibilidade de resistência (esta descrição encontra-se no Livro “A Guerra das Laranjas/A perda de Olivença”, de António Ventura, 2004, Ed. Prefácio).
Até 1811, decerto houve alguns conflitos em terras em redor de Ouguela, mas de pouca monta, pois quase nada chegou até nós. Os vários conflitos do início do século XIX pouco rasto deixaram na região.
A novidade seguinte, pouco alegre para a vila, é que em 1836 se extinguiu o concelho, sendo unido a Campo Maior. A decadência, que já vinha do século XVIII, reflectia-se a nível administrativo. E algo pior sucedeu, quando Ouguela deixou de ser freguesia e foi anexada a São João Baptista (Campo Maior) (1941).
É um pouco triste seguir esta história. Uma povoação nasceu e cresceu, teve momentos de alguma grandeza e de glória… e iniciou um processo de decadência.
Algumas quadras populares falam de Ouguela. Uma refere-se à sua grandeza:
Bela cidade de Ouguela
Dá vistas à lapagueira
Mal empregada cidade
Estar em tão alta ladeira
A lapagueira será um acidente geográfico.
Outra ironiza com a sua decadência, e, com algum sentido de humor, reza assim:
Adeus vila de Ouguela
Que não há vila mais nobre
Para teres vinte ruas
Faltam-te só dezanove
Assim é a roda da história. Olhando as velhas muralhas, a que não falta ainda opulência, sentimos-nos comovidos. Uma inscrição em latim, num dos arcos, informa-nos de uma divisa dos seus antigos defensores e moradores. “pro patria, pro rege et pro fide, aut vincere, aut mori” (pela pátria, pelo rei, e pela fé, vencer ou morrer).
O tempo é (mesmo) implacável.
Há, todavia, que pensar no futuro. Ouguela, hoje com apenas cerca de 60 habitantes, terá de procurar reerguer-se. O seu castelo, que já foi palco de filmagens de séries de televisão, tem uma beleza indesmentível. Há que ser-se imaginativo e ter força de vontade, e aproveitar tão vetusto monumento. Agora já não, porque felizmente tal não é necessário, como lugar de defesa, mas quiçá, como lugar de encontro, entre as raias alentejana e extremenha.
Que esta singela história da antiga vila, hoje “lugar”, de Ouguela, abra caminho nesse sentido, seja um primeiro passo, eis o meu sincero desejo.

Estremoz, 2 de Novembro de 2005
Carlos Eduardo da Cruz Luna

ELVAS



BREVE HISTÓRIA DE ELVAS

1) AS ORIGENS
Ergue-se a cidade de Elvas, uma das mais importantes de Portugal, a cerca de 70 Km. a Nordeste de Évora, 40 Km. a Leste de Estremoz, 9 Km. a Noroeste do Guadiana, e 12 Km. a Oeste de Badajoz.
Trata-se duma daquelas cidades cuja origem remota é bastante obscura. Isto, porque sendo abundantes os vestígios dae presença humana desde a Pré-História até à Época visigótica, os mesmos estão normalmente dispersos pela área do Concelho (antas ou dólmens, estátuas romanas de grande qualidade, e outros artefactos), não sendo possível saber se no local onde hoje se ergue a Urbe existiu ou não uma povoação antiga de razoáveis dimensões. Considerando o factor geográfico, é bem provável que sim. Contudo, as teorias, inúmeras, avançadas a esse respeito, nada produziram de realmente concreto... não passando mesmo algumas de invenções e piedosas fantasias.
Ao certo, sabemos que os Muçulmanos ali ergueram uma cidade, com uma fortaleza, a que chamaram Yalbas ou Yelch. Dependeu da Taifa de Batalyaws (Badajoz), independente durante algum tempo. Em 1166, D. Afonso Henriques conquistou-a, para logo ser perdida. E só no ano de 1226 os Cristãos se aproximaram de novo. Em 7 de Setembro de 1228, rendia-se a D. Sancho II. Logo Elvas (nome claramente derivado dos topónimos árabes) recebeu uma Carta de Foral (Maio de 1229). As muralhas foram em seguida e rapidamente reconstruídas, aproveitando a traça moura. É perfeitamente visível a herança arábica nas ruas mais antigas, e, na fortificação medieval, a mesma herança é por vezes impossível de separar da cristã.
2) INTEGRAÇÃO DEFINITIVA EM PORTUGAL E IDADE MÉDIA
Em 1228 ou 1230, Batalyaws (Badajoz) caía em posse do Reino de Leão. As duas cidades tomavam, quase ao mesmo tempo, o lugar por que mais ficaram conhecidas na História. Duas urbes fortificadas, vigiando-se e hostilizando-se, em tempo de guerra, e comerciando e fazendo o papel de porta de entrada de Portugal, de um lado, e de Leão, depois Castela, por fim Espanha, do outro, em tempo de paz.
A importância que Elvas teve desde o início está patente no facto de em 1262 nela se efectuar uma primeira Feira. D. Afonso III também beneficiou a cidade, em 1271, enquanto D. Dinis, em 1280, mandou fazer obras no seu Castelo.
Evidentemente, vários conflitos internos e algumas guerras com Castela se fizeram sentir ali.
Em 1383, era assinado em Elvas um Tratado pelo qual o rei D. Fernando casava a sua filha D. Beatriz com D. João de Castela. Como se sabe, tal casamento foi uma das causas da crise de 1383-1385. As cidades e vilas do Centro e Sul de Portugal, quase todas, e algumas do Norte, abraçaram a Revolução. Também o fez Elvas, vendo-se todavia rodeada, por algum tempo, por praças favoráveis a Beatriz e João de Castela (Campo Maior, Olivença, e Vila Viçosa), o que provocou muitos confrontos na Região. Gil Frenandes, ou Gil "Navalha", o alcaide, desembaraçou-se com habilidade e valentia, sendo por isso considerado um dos primeiros heróis de fama nacional dali oriundos. Abundam episódios sobre a sua vida, alguns dos quais seguramente míticos..
O Castelo tinha, ao tempo, 22 torres e 11 portas. Até pouco depois de 1390, portugueses e castelhanos defrontaram-se à sua beira e nos territórios próximos, fazendo incursões e destruindo com afã, dum e doutro lado, tudo o que podiam... provando, como se tal ainda fosse necessário, ser a guerra uma das actividades mais destrutivas, estéreis, e desumanas, já inventadas pelo Homem.
A Paz, definitiva, chegou em 1411, e, com ela, reatou-se um profícuo laço comercial entre Elvas e Badajoz.
3) ERA DOURADA
D. João II, que mandou proceder a obras nas praças fronteiriças, fez levantar no Castelo a Torre de Menagem, por volta de 1488, além de ordenar que se iniciasse a construção de uma barbacã, só terminada já no reinado de D. Manuel I. Aliás, o reinado de D. Manuel, e os seguintes, foram dos mais importantes para a História da Região. A Paz reinante ajudava a que se verificassem vários progressos, com poucos sobressaltos. Elvas e Olivença terão sido as povoações da Raia que mais beneficiaram com isso. Portugal, recorde-se estava no seu apogeu. Os Descobrimentos pareciam trazer riquezas sem fim. Em Elvas, foi construída a Igreja Matriz (Sé), alterada uns séculos depois, e foi remodelada a Igreja de São Domingos, que datava do Século XIV. Foi construída a Ponte da Ajuda entre Elvas e Olivença (talvez 1510-1520). E continuaram as obras do imponente Aqueduto da Amoreira, aliás já iniciadas no século XV, e que se prolongariam até ao Século XVII. No numeramento de 1527, Elvas surge como a quinta maior cidade portuguesa, atrás de Lisboa, Évora, Porto, e Santarém. Próximo, só Olivença, e, um pouco mais longe, Estremoz e Portalegre, podiam aspirar, remotamente, a com ela rivalizar. Olhando os números, sem dúvida que Elvas, com os seus cerca de 8 000 habitantes, se destacava no meio de Olivença ( 4 000 habitantes ), Estremoz ( 3 200 ), Vila Viçosa ( 3 000 ), Campo Maior ( 2 500 ), e Portalegre ( 6 000 ). A capital da província, Évora, andaria por volta dos 15 000 moradores.
Esta situação justifica o facto de pouco antes, em 21 de Abril de 1513, ter sido atribuída a Elvas a categoria de Cidade. E em 1570, surgiu nova promoção, ao ser transformada em sede de Bispado, com os territórios vizinhos do extinto Bispado de Ceuta ( Olivença, Campo Maior, Ouguela) e outros, retirados a Évora. Só em 1881 desapareceria esta dignidade, como se verá.
A época dos Descobrimentos viu inúmeros elvenses partirem para todos os cantos do mundo, tendo alguns ficado famosos. Entretanto, o Século XVI veria o País passar da prosperidade a uma crescente situação de crise.
4) CRISE E GUERRA
Em 1580, ao contrário do que sucedera em 1383, Elvas abriu as portas a Filipe II de Espanha, que nela ficou durante algum tempo antes de seguir para Lisboa. A propósito, assinale-se que, pela sua importância, a cidade foi recebendo visitas, algumas prolongadas, de vários soberanos, quase desde a sua integração em Portugal. Diga-se desde já que assim continuou a acontecer a partir de então.
A União das coroas de Portugal e Espanha num mesmo soberano beneficiou inicialmente Elvas, mas não tanto como se pensava ou desejava. E, à medida que os tempos corriam, surgiram situações de descontentamento, comuns a todo o País. Não foi por acaso que, em 1637, surgiu uma revolta de alguma importância. Curiosamente, durante essa revolta popular que passou à História com o nome de "Revolta do Manuelinho", pouca ou nenhuma agitação se viu em Elvas, o que parece ser estranho, dado que se produziram levantamentos em terras próximas (Olivença, Alandroal, Vila Viçosa, Borba, Cabeço de Vide, e outras). Parece que as classes dominantes em Elvas conseguiram prevenir problemas, e talvez os laços com Badajoz, de que a cidade muito dependia, o tenham evitado.
A verdade é que, no início de 1640, Elvas não parece ter reagido muito contra os impostos lançados por Olivares. Todavia, em Dezembro do mesmo ano, a notícia da separação de Portugal não provocou hostilidade, antes uma aceitação pacífica. E, logo no início de 1641 Elvas se armou com homens e material de guerra, e em 1642 iniciaram-se trabalhos acelerados de construção de uma nova cintura de fortificações, capaz de resistir à artilharia ( o chamado "estilo Vauban" ). Nasciam assim as modernas muralhas de Elvas, às quais mais tarde seriam acrescentados os fortes circundantes. Como a cidade dispunha já de uma poderosa muralha, em parte edificada nos tempos de D. Manuel I, foi possível, em alguns casos, uma reconversão. Todavia, a concepção era completamente nova, e muitas vezes os muros existentes serviram apenas de "pedreira" ao pé da porta para novas paredes. Também Estremoz e Olivença foram beneficiadas com muralhas semelhantes, bem como a mais pequena Juromenha. Campo Maior e Vila Viçosa efectuaram obras de vulto nos seus castelos medievais. Situações semelhantes ocorreram ao longo de toda a Raia, do Minho ao Algarve.
Em 1644, a Guerra chegou mesmo, sendo Elvas cercada inutilmente por algum tempo pelo exército espanhol. O quadro já descrito para 1383-1390 repetiu-se. Mais uma vez, exércitos dos dois lados em confronto se odiaram na fúria da Guerra, causando a morte e a destruição dos dois lados da fronteira. Eis o resultado e o triste preço a pagar pelas desastrosas políticas de governantes e classes dirigentes, ansiosos por aumentar os seus domínios e as suas riquezas sem olhar a meios, e esquecendo-se de procurar beneficiar as classes mais desfavorecidas. E, como em todas as guerras, era o povo simples, e quase sempre só ele, independentemente de raça ou língua, a pagar o preço das consequências desastrosas de tantas ambições e fracassos.
Graves confrontos, entretanto, se produziram em 1657. Olivença caíu, e muitos dos seus habitantes se refugiaram em Elvas, enquanto outros se distersavam por Juromenha, Alandroal, Vila Viçosa, e Estremoz. Elvas resistiu, mas ficou mais ameaçada no flanco sudeste.
5) O ANTIGO REGIME
O fim, todavia, estava próximo. A 14 de Janeiro de 1659 a batalha, dita "das Linhas de Elvas", destroçava uma poderosíssima invasão espanhola, e punha praticamente fim a qualquer esperança de Madrid de vir a conseguir recuperar Portugal. Ao lado das batalhas do Ameixial e de Montes Claros, este evento assinalou claramente o apogeu da guerra, mas também o seu final. É quase inútil dizer que correu sangue, muito sangue, naqueles campos de batalha. Não é sempre assim ? Por que será que não serve de lição ? A Paz de 1668 foi evidentemente bem vinda. As fronteiras na Península foram repostas como eram, regressando as populações aos seus lares, muitas vezes destroçados. Poder-se-ia agora voltar a comerciar e a contactar normalmente com o vizinho, procurando benefícios mútuos.
Infelizmente, o Alentejo e a Extremadura espanhola pouco tempo tiveram para sarar as suas feridas. Entre 1703 e 1713, a Guerra regressou. E Elvas, bem como Badajoz, foram de novo palco de confrontos. Em 1709, por exemplo, o exército espanhol do Marquês de Bay fazia ir pelos ares os arcos centrais da Ponte da Ajuda, talvez um pouco como vingança de em 1706 não ter conseguido entrar em Elvas.
Ficaram assim dificultadas as ligações entre as duas margens do Guadiana e entre as urbes irmãs até então. A paz veio, mas a reconstrução da Ponte foi sempre sendo adiada ao longo de todo o século XVIII.
Ninguém podia duvidar que Elvas era uma cidade militar. Por volta de 1750, quando surgiu nova ameaça de conflito, viviam nela 10 000 "civis" e 7 400 militares !
E, contudo, algo de negativo estava a surgir. Aparentemente, nada mudava, mas, na verdade, a importância relativa de Elvas no País ia decrescendo. Elvas crescia com o natural aumento demográfico geral, mas não mais do que isso. O litoral português começava a "adiantar-se em relação ao interior, ainda que isso na época passasse despercebido.Entretanto, Elvas era uma das capitais das cinco subdivisões administrativas maiores em que o Alentejo se subdividia desde o século XV. De Elvas dependiam os Concelhos de Ouguela, Campo Maior, Vila Boim, Barbacena, Vila Fernando, Juromenha, Olivença, Alandroal, Terena, Capelins, e Monsaraz. Quase toda a Raia, afinal. Note-se que este era um dos tipos de subdivisões existentes. Outras existiam, paralelas, com competências por vezes contraditórias, o que provocava muitas confusões. O Alandroal, por exemplo, "obedecia" a Elvas em determinados assuntos, mas dependia de Vila Viçosa para outros, e até de Avis para alguns outros.
6) A DIFÍCIL ENTRADA NO SÉCULO XIX
A Revolução Francesa ( 1789 ) teve reflexos mais ou menos profundos em Portugal e Espanha, principalmente pelo pavor que se apoderou das classes dirigentes e das Casas Reais. Para Portugal, a situação piorou principalmente quando a Espanha, esquecido pragmaticamente o pavor, entrou na órbita francesa (1795-1796). Em 1801, o exército espanhol sob o comando de Godoy, após a capitulação de Olivença, cerca Elvas. A cidade não se rendeu, mas Godoy arrancou junto às muralhas dois ramos de laranjas que enviou à Rainha de Espanha, gesto que deu o nome, irónico e jocoso, ao curto conflito: Guerra das Laranjas. Houve ainda tempo para, após duras lutas e uma resistência encarniçada, tomar Campo Maior.
A Paz, consagrada no Tratado de Badajoz, assinalou também, desde a sua assinatura, o surgimento de um litígio cuja resolução final ainda se aguarda, concretamente a questão da posse de Olivença. De qualquer forma, logo em 1807 recomeçava a Guerra. Invasores franceses, aliados aos espanhóis, ocuparam Portugal. Em Elvas estiveram até 1 de Outubro de 1808, seguindo para Lisboa para regressarem à Gália. A segunda invasão francesa em nada afectou Elvas, mas a terceira viu portugueses, ingleses, e espanhóis ( agora aliados ), lutarem, juntos para expulsar os invasores, nomeadamente nas regiões de Elvas e Badajoz, perseguindo-os até território francês (1813). Os acordos de Paris de 1814 e Viena de Àustria de 1815 pacificaram a Europa. Segundo Portugal, tais acordos implicariam a retrocessão de Olivença. Esta situação dúbia impediu, no mínimo, até aos nossos dias, que a velha Ponte da Ajuda fosse reconstruída, pois rodeiam-na delicadas questões diplomáticas. Apenas se conseguiu, depois de inúmeros contratempos, e só em 2000 (11 de Novembro) construir uma nova a cem metros das ruínas da antiga, o que significou o abrir de novos horizontes, mas não levou à resolução do litígio nascido na época napoleónica.
Em 1820, Portugal conheceu o primeiro esboço de Democracia. Mas, poucos anos decorridos, voltou a vigorar o tradicional regime absolutista. Foi necessária uma dolorosa guerra civil (1832-1834) para se entrar na modernidade. Como os últimos episódios dessa guerra decorreram no Alentejo, Elvas foi por isso algo afectada.
7) NOVOS TEMPOS
Muitas mudanças se produziram então. Eram novos tempos. Por exemplo, muitos edifícios religiosos, principalmente conventos, passaram para as mãos do Estado, que neles instalou serviços seus ( Câmara Municipal, Hospital, Tribunais, etc.). Por outro lado, Elvas viu o seu concelho ser engrandecido com a anexação de vários antigos concelhos vizinhos extintos: Vila Boim, Barbacene, Vila Fernando, e Terrugem. Ainda afectou Elvas a nova divisão administradtiva de 1835, que dividiu o Alentejo em três distritos. O mais setentrional abrangeu Elvas, mas a sua sede acabou por ser colocada em Portalegre, perdendo a primeira importância administrativa. Ainda hoje os elvenses tendem a afastar-se da área de influência de Portalegre, quase parecendo esquecer-se que dela dependem...
A Regeneração, em 1851, veio por fim a alguns conflitos que, por mais de uma vez, afectaram os primeiros tempos do Regime Liberal, e que tiveram algum eco, por vezes, em Elvas.
É na segunda metade do século XIX que se constrói a ponte luso-espanhola sobre o Caia. Mais tarde, surgiria o comboio,e a ligação a Badajoz. Todavia, em 1881, era extinto o Bispado, e Elvas passou a depender eclesiasticamente de Évora. Afinal, confirmava-se o que começara a ser vagamente perceptível no século XVIII: o peso relativo de Elvas ia diminuindo.
Claro que Elvas se viu afectada pelas convulsões da Primeira República (1910-1926), mas este regime, demasiado concentrado em Lisboa, não convidou a uma participação muito activa das povoações do Interior. Pior seria a Centralização do Regime que se seguiu (Ditadura e Salazarismo, ou Estado Novo), que só findaria com o regresso à Democracia em 25 de Abril de 1974.
Não se pode deixar de assinalar que a desigualdade da distribuição da riqueza e as injustiças sociais a ela associadas caracterizaram a sociedade elvense, bem como a alentejana em geral, nos séculos XIX e XX. Não que não existissem antes, claro, mas porque uma maior liberdade de expressão, uma crescente consciencialização de tal realidade, e as necessidades económicas, tornaram mais evidente esta situação. Tudo isto, associado a um relativamente fraco desenvolvimento das forças produtivas e a uma insuficiente inovação tecnológica, foi-se revelando prejudicial a um verdadeiro desenvolvimento, muito menos de forma harmoniosa para a sociedade em geral.
8) O SÉCULO XX
Claro que a cidade não ficou parada. Foi alastrando mesmo para fora das muralhas, e no século XX um plano de urbanização, concluído em 1986, procurou que tal ocorresse de forma ordenada.
A Guerra Civil de Espanha (1936-1939) deixou igualmente as suas marcas em Elvas, por vezes de uma forma, digamos, "personalizada". Parte das elites, apavorada com uma eventual ameaça comunista, pactuou, com o apoio do Governo Central, com as forças repressivas franquistas, ajudando a enviar refugiados para Badajoz, onde foram quase todos fusilados. Outros extractos da população, bem como parte das elites, procurou auxiliar e esconder muitos pacenses que procuravam salvar a vida saindo de Badajoz ou arredores e entrando em Portugal. Porque este tema é delicado, falta fazer a sua História.
As décadas de 1950 e 1960, apesar das barreiras alfandegárias e de dificuldades pontuais, viram intensificarem-se as relações entre Elvas e Badajoz. Inclusivamente com o recurso, também tradicional, ao contrabando. Inicialmente, era o lado português que dispunha de vantagens económicas e de maior poder de compra, mas a partir das décadas de 1970 e 1980 a situação foi-se invertendo.
Aliás, ao longo dos séculos XIX e XX (neste, principalmente), Badajoz, durante séculos comparável a Elvas, e pontualmente com menos população, cresceu de forma assinalável, sendo hoje quatro ou cinco vezes maior do que a sua vizinha, o que criou alguns complexos de inferioridade.
A população de Elvas também foi crescendo, mas lentamente, até à década de 1960, quando começou a verificar-se a situação inversa. Apesar da actividade comercial, muito ligada a Badajoz e à Espanha em geral, ocupar muita gente, revelou-se, na verdade, e continua a revelar-se, insuficiente para, por si só, contrariar essa tendência. No início do Segundo Milénio, o Concelho de Elvas tinha cerca de 23 800 habitantyes, cerca de 18 000 só na cidade.
Recorde-se aqui um episódio de valor simbólico: em 11 de Novembro de 2000, foi inaugurada uma nova ponte enttre Elvas e Olivença, o que, como já se disse, deverá ter aberto novos horizontes. Trata-se de procurar caminhos para o futuro, não abdicando de princípios.
9) REFLEXÕES FINAIS
Alguns dos problemas actuais de Elvas são os de Portugal no seu conjunto. O interior do País tende a desertificar-se, perdendo peso. Com isso, torna-se menos atractivo. Não há investimento produtivo porque, entre outras coisas, não há mercado consumidor. Não havendo produção, não há nada para consumir. É um ciclo fechado. Como se tal não bastasse, o Poder Central vai incentivando, ou nada faz para o evitar, o encerramento de serviços. Ainda recentemente circularam notícias nesse sentido ( Quartel, Maternidade ), o que acentua a idéia de declínio e aumente a sensação de inferioridade.
Os responsáveis elvenses, melhor ou pior, têm feito o possível e o impossível para sair deste círculo vicioso. Mas... muita coisa há que mudar em Portugal no seu todo para que se atenuem e combatam as muitas assimetrias que subsistem.
Apesar de tudo, dispõe-se de um bem precioso. A Paz. E Elvas sempre prosperou, às vezes nem tanto como seria desejável, num tal clima. Relacionando-se, por exemplo, amigavelmente com os seus vizinhos do Leste. Há que aproveitar projectos que, num clima de respeito mútuo e de igualdade, beneficiem todos os envolvidos.
Elvas herdou uma arquitectura invejável e quase única. As suas muralhas "estilo Vauban", intactas, fazem dela, e mesmo que fosse só por isso, um monumento sem par. São inúmeras as construções grandiosas, religiosas ou não, que por detrás delas se abrigam, algumas mesmo fora delas. As velhas ruas populares, com o seu traçado mourisco, constituem outro tesouro histórico.
Tudo isto, herança do passado, tem imenso valor no presente, e é um factor inigualável de valorização da cidade. Claro que o futuro passará por inúmeros factores, necessariamente inovadores, mas este dado adquirido, bem aproveitado, é desdfe já uma vantagem.
Este texto, porque limitado no espaço, não pormenorizou inúmeros outros aspectops importantes da História de Elvas. Claro que existem muitos mais monumentos do que os poucos referidos, e não se referiram inúmeras personalidades de relevo nascidas na cidade ao longo dos séculos. Pretendeu-se, apenas, dar uma idéia geral e breve da História do Burgo elvense, que desperte em quem o leia a curiosidade de saber mais e, claro, o desejo de o visitar.
Estremoz, 22 de Fevereiro de 2006
Carlos Eduardo da Cruz Luna

TERENA


TERENA: 5000 ANOS DE HISTÓRIA

1) ORIGENS

Terena, uma das mais antigas povoações de Portugal. situa-se a 11 Km. a Sul do Alandroal, a 10 Km. a oeste do Guadiana, 10 Km. a Leste do Redondo, 29 Km. a norte de Reguengos de Monsaraz. Juromenha, outra antiga vila hoje integrada no Alandroal como a presente, dista 22 Km. em linha reta.
É notável a antiguidade desta antiga vila, sede de Concelho até meio do Século XIX. A região era habitada já por volta de 3000 a.C., pois, a cerca de 2 Km. a leste, na Ribeira de Lucefécit, encontramos o chamado "Castelo Velho", um recinto fortificado com 5000 anos. E, como se não bastasse, a 1 Km. a Noroeste de Terena, temos um outro recinto fortificado, o "Castelinho", datado de cerca de 1000 a.C..
Considerando que estamos numa região alentejana rica em megálitos, é-nos difícil afinal dizer em que remota data se produziu uma primeira ocupação humana na região da antiga vila.
Entre ouitras coisas, encontrou-se a 4 Km. ao norte da mesma um local de culto datando da época romana; nele foram recolhidas noventa lápides, na maioria hoje no Museu Arqueológico Nacional em Lisboa. A divindade alvo de culto era aliás pré-romana, e denominava-se "Endovélico" (talvez do céltico "Andevellicos", significando "muito bom"). Não muito longe, descobriu-se recentemente um local de culto mais primitivo, talvez o primeiro dedicado a tal dividande, "transferido" pelos romanos. No século XVI, existiam ainda no local do Templo Romano 96 colunas de mármore de Ordem Jónica, retiradas nesse século e no seguinte para decorar edifícios em Évora e Vila Viçosa. No local do antigo templo (séc. I ?), ergueu-se mais de mil anos depois uma ermida (São Miguel da Mota).
Uma primitiva Terena ter-se-á, quase certamente, erguido em redor ou próximo do Templo de Endovélico.É pouco claro o que lhe terá sucedido com as Invasões Bárbaras no início do Século V. Consta que no século VIII os muçulmanos a terão destruído, mas, por obra dos mesmos, surgiu um grande povoado na região chamado, tudo o indica, "Talanna". Se não ficava situado no local do antigo Templo Romano de Endovélico, não deveria ficar longe, mesmo porque tudo indica que o topónimo moderno (Terena) terá tido origem na designação árabe.

2) TERENA PORTUGUESA

Em 1262 Terena, decerto após destruiçôes resultantes da Reconquista, é (re)fundada, cristãmente, por D. Gil Martins (Reinado de D. Afonso III). O Foral dava-lhe quase toda a área meridional do actual Concelho do Alandroal. Terena deverá então ter sido edificada, ou reedificada, junto da Igreja da Boa Nova, recebendo o nome de Santa Maria de Terena.
O Santuário de Nossa Senhora da Boa Nova, vulgo Igreja da Boa Nova, é referido já no Século XIII. A sua antiguidade poderá ser muito grande mesmo, podendo provavelmente tratar-se da cristianização de um culto muito, muito antigo mesmo. Todavia, a sua forma actual remete-nos arquitectonicamente para o século XIV, e ainda assim há sérias dúvidas. Talvez se esteja perante um edifício sucessivamente reconstruído e remodelado. Hoje, encontramo-nos perante um templo em forma de fortaleza, com ameias. Interiormente, alberga pinturas, e de cada lado do altar-mor estão sumptuosos tocheiros. O conjunto é gótico. Uma tradição diz ter sido construído no século XIV, mas, como há muitas dúvidas, tal só poderá estar parcialmente correcto.

3) O SÉCULO XVI

Terena recebe novo foral ( manuelino ) em 10 de Outubro de 1514. Contudo, fala-se então de uma povoação chamada São Pedro de Terena. Tudo indica que já no século XVI, portanto, Terena se terá "mudado" para a sua actual localização, quiçá por razões de salubridade. O Castelo, que parece datar do século XIII, e que portanto distava da aglomeração primitiva (sabe-se lá porquê...), terá talvez tido influência na mudança da povoação, da zona da Boa Nova, para o outeiro onde as muralhas protegeriam melhor as suas gentes.
Sendo uma praça fronteiriça, Terena teve uma História acidentada. O Castelo terá sido fundado, ou restaurado, por D.Dinis, sendo possível que tenha sido reforçado na época de D.João I. D.João II terá querido dar novo fôlego a Terena, restaurando uma vez mais o Castelo, que ainda sofreu acrescentamentos manuelinos. Datará dessa época (séculos XV-XVI) uma nova (?) Torre de Menagem, bem como uma barbacã.
No numeramento de 1527-1531, Terena surge como tendo cerca de 600 habitantes (800, no máximo). Nos seus arredores, o Alandroal tinha cerca de 1 100 habitantes, Juromenha 600, Vila Viçosa 3 000, Monsaráz 2 500, Borba 2 300, Olivença 4 000, Estremoz 3 200. As maiores cidades próximas eram Elvas (cerca de 7 000 habitantes) e Évora (entre 12 000 e 15 000).
No século XVI terão sido construídos os Paços do Concelho, a Misericórdia, a Torre do Relógio, e a já referida Torre de Menagem. Outros monumentos se destacam em Terena, como o Pelourinho renascentista, a Igreja Matriz, e a Rua Direita no seu conjunto, com portadas góticas, renascentistas, e barrocas, e ainda grades e chaminés típicas.

4) AS GUERRAS

Pouco se sabe sobre movimentações militares em redor de Terena em 1383-1385, ou nos anos seguintes. Já na Guerra da Restauração (1640-1668), a vila esteve em destaque. Por exemplo, em 1652 as tropas espanholas do Duque de S.Germánsaquearam os campos, recolhendo depois a Barcarrota, escapando-se apesar de perseguidas por tropas da mesma Terena e de Olivença. Tendo deixado, todavia, parte do saque na circunvalação externa da Praça espanhola, os portugueses recuperaram essa parte e levaram-na para Olivença, onde os lavradores de Terena foram recuperar os seus bens. Todavia,em 1656 ( noutro exemplo), Terena foi cenário de violentos combates, e num espaço de poucos dias foi ocupada por espanhóis e recuperada custosamente pelo exército português.
O Século XVIII viu um certo declínio. A sua economia foi enfraquecendo. Como se não bastasse, Terena foi uma das povoações alentejanas que mais danos sofreu com o terramoto de 1755. Não ficou destruída, claro, mas verificaram-se muitos estragos.

5) DECLÍNIO

A época pombalina não parece ter sido importante na região. A sua decadência prosseguiu, e, já no século XIX, a sua economia foi ainda mais abalada com o corte de ligações para além Guadiana depois de 1801, não tanto por ter ligações directas com a região de Olivença, ainda que algumas existissem, mas sim porque tinha laços com o Alandroal e com Juromenha, estas directamente afectadas, em especial esta última povoação.
Na primeira metade do século XIX, vários Concelhos com expressão reduzida acabaram por se unir em torno do que foi o único sobrevivente, o do Alandroal. Foram eles Juromenha, Ferreira de Capelins (um estranho Concelho de reduzida população, hoje Santo António de Capelins), Terena, e, obviamente, o próprio Alandroal. Tal junção de esforços não trouxe exactamente progresso ou benefícios sensíveis, como bem o sabem os seus actuais habitantes, ainda que houvesse períodos de alguma prosperidade.

6) O PRESENTE, COM INTERROGAÇÕES PARA O FUTURO

Terena deixou de ser sede de Concelho por volta de 1835, e, perdendo a atracção de polo administrativo, a sua população foi diminuindo. Para demonstrá-lo, temos os números da segunda metade do século XX: 1986 habitantes em 1950, 1081 em 1960, 1119 em 1970 (uma ligeira recuperação, logo contrariada)), um pouco mais de 600 em 1991 !
Continua a ser, todavia, extremamente recompensador percorrer a Vila de Terena, com os seus 5000 anos de História presentes um pouco por todo o lado, na área do antigo Concelho. Para além das casas (com destaque para a já citada Rua Direita) e monumentos, a subida ao Castelo, com as suas quatro torres semi-cilíndricas, e onde se podem observar três materiais em harmonia (granito, mármore, e ardósia), dá-nos um soberbo panorama, limitado, a Leste, pela Serra de Alôr ( ou Olôr, ou Lôr), e, a Noroeste, pela Serra de Ossa.
O que se poderá fazer para acudir a esta região, progressivamente abandonada, onde as pedras, carregadas de História, têm cada vez menos homens por companhia?
Estremoz, reformulação de 08 de Janeiro de 2006
Carlos Eduardo da Cruz Luna

ALANDROAL


BREVE HISTÓRIA DO ALANDROAL

1)INTRODUÇÃO / OS PRIMÓRDIOS
Fica a vila do Alandroal a cerca de 12 quilómetros do Guadiana (margem Oeste/Direita),
cerca de 35 Quilómetros a sudoeste de Elvas, 45 a Es-nordeste de Évora, 10 quilómetros ao
Sul de Vila Viçosa, 23 a oeste de Olivença, e cerca de 40 a norte de Reguengos de
Monsaraz. É uma vila do interior de Portugal, da província do Alentejo e do Distrito de
Évora.
É muito difícil dar indicações seguras sobre a sua origem. Situa-se numa região onde
há vestígios pré-históricos de vários tipos. Também não faltam vestígios romanos .
Esclareça-se que, neste trabalho, quase nunca se entrará em linha de conta com Juromenha,
Terena, e Capelins, que foram Concelhos independentes até ao início do século XIX, e
sobre os quais há ensaios históricos publicados.
Na época de domínio muçulmano, é quase certo ter existido algo de alguma importância,
já que vários investigadores acreditam ver vestígios desses tempos no próprio castelo, o
que, todavia, se poderá explicar de outra forma, como adiante se verá. Foi unida a
Portugal, primeiramente, por D. Afonso Henriques, em 1167. D. Sancho I, o filho, tê-la-á
doado à Ordem de Avis. Mas, por volta de 1190, perdia-se, e só na época de D. Sancho II,
talvez em 1228, os muçulmanos a deixaram de vez.
Reza a tradição (e há documentos) que terá sido fundada, na usa "forma" moderna, no
reinado de D. Dinis, em 1294-98, com edificação do Castelo, por D. Lourenço Afonso, nono
Mestre da Ordem de Avis, de que passou a ser comenda. D. Dinis, ao que parece, mandou
reforçar, logo em 1312, com 17 torres, a fortaleza. Uma inscrição na mesma, em letras
góticas, esclarece que foi um mouro, de nome Galvo, que foi o seu arquitecto. A dúvida
reside em saber se os vestígios muçulmanos no local derivam da técnica do provável
construtor, ou se significarão uma qualquer presença anterior efectiva muçulmana nele. A
primeira hipótese afigura-se mais razoável. De qualquer forma, o Castelo Medieval, que
está a um altitude de 343 metros, já revela algumas adulterações, pois até no século XVII
sofreu pequenas modificações. Mesmo assim, conservam-se ainda três portas ogivais e
muitos panos e muralha quase intactos, para além de cubelos e torreões. De notar as
muitas inscrições existentes, pois quase não há torre ou porta que não contenha uma lápide. Recordemos que um Castelo, então,
não era um monumento. Era uma necessidade.
Não espantam os cuidados com as muralhas, pois o Alandroal situava-se em zona
fronteiriça. Só em 1297 ficaram definidos os limites, digamos, internacionais, mas,
claro, continuou a ser uma praça raiana. Os castelos de Terena, Juromenha, Monsaraz,
Olivença ( os mais próximos do lado português) aí estavam para o mostrar, bem como, do
lado espanhol, entre outros, se destacava Alconchel.
O nome Alandroal deve-se, tudo o indica, ao facto de existirem aloendros, ou
aloandros, ou loandros, ou, modernamente, loendros, em grandes quantidades no local. É
lógico que se chamasse Landroal (campo de loandros) à povoação. Depois, evoluiu para
Alandroal... embora, a nível de oralidade tradicional, a velha forma seja muito comum

. 2)O ALANDROAL NA CRISE DE 1383-1385

Azeite, cereais, gado, e algum minério de ferro, faziam do Alandroal uma terra
apetecida. Todavia, a sua autonomia era relativa, pois não tinha foral régio, como Vila
Viçosa, Juromenha, Terena, Monsaráz, ou Redondo.
A crise de 1383-1385 vai tornar o Alandroal conhecido. Na verdade, em 1383, o seu
alcaide, Pero (ou Pedro) Rodrigues da Fonseca, vai aderir aos revolucionários partidários
de D.João, Mestre de Avis, ao contrário dos alcaides vizinhos de Vila Viçosa, Campo
Maior, e Olivença, que optaram por ser partidários de D. Beatriz, casada com João I de
Castela. E, se já era uma coincidência os dois candidatos ao trono português terem o
mesmo nome, uma coincidência maior se verificou na região. Na verdade, o Alcaide de
Olivença tinha o mesmo nome (Pero Rodrigues da Fonseca) do do Alandroal. Como os dois
estavam em campos opostos, e houve combates, alguns observadores e historiadores menos
atentos, crendo tratar-se de uma só pessoa, têm produzido alguns dos textos mais cómicos
que se possa imaginar. De qualquer forma, em 1389, Olivença, Vila Viçosa, e Campo Maior
estavam já subordinados a Lisboa.
Pero Rodrigues da Fonseca ficou a ser alcaide de duas povoações (Alandroal e
Olivença). Os seus feitos são lembrados nos Lusíadas (séc. XVI), e o seu nome perpetua-se
nuns pequenos bolos locais (os "Pero-Rodrigues"). Os descendentes deste personagem, ao
que parece, tomaram o apelido de "Encerrabodes", uma referência, diz-se, ao facto de um
grupo de castelhanos ( os "bodes") ter ficado cercado ("encerrado") num combate. Como
não me canso de repetir, as Guerras são um tipo de acontecimento em que o bom senso quase
nunca está presente. Algo a evitar, portanto.

3) AS CARTAS DE FORAL E OS SÉCULOS XV E XVI

Não se sabe muito do que sucedeu no Alandroal no início do século XV. Relevante,
mesmo, foi a atribuição de Foral pelo rei D. João II, em 1486. A vila ficava equiparada
às povoações vizinhas, que depois ultrapassaria (Terena e Juromenha, por exemplo), mas
não há muitos dados sobre a evolução da população.
Só no Numeramento de 1527-1573, o mais antigo de Portugal, e quase sempre citado
nestes trabalhos, o Alandroal é referido, com 284 fogos, ou cerca de 1100 habitantes.
Pode-se então compará-lo com as povoações vizinhas, como Juromenha com 150 fogos (pouco
mais de 600 habitantes, ao que se julga), Elvas (1916 fogos, cerca de 7000 habitantes),
Olivença (1053 fogos, cerca de 4000 habitantes), Vila Viçosa (talvez 800 fogos e cerca de
3000 habitantes), Estremoz (969 fogos, aproximadamente 3200 habitantes), Borba (600
fogos, cerca de 2300 habitantes), Terena (170 fogos, talvez 650 habitantes), Ouguela 144
fogos (cerca de 600 a 650 habitantes). Campo Maior teria cerca de 2900 habitantes,
Alegrete cerca de 1000 habitantes, Arronches 3300 habitantes, Marvão 1700 , Monforte
2500. Évora, a capital da Província do Alentejo, teria entre 12 000 e 15 000 habitantes.
Surpreende um pouco, mas parece provar-se que o Alandroal, mesmo sem foral régio, terá
tido umas razoáveis dimensões, já que não parece crível que entre 1486 e 1527 tenha
crescido ao ponto de ultrapassar Juromenha, Terena, Ouguela, e Alegrete. Seria uma
comenda consideravelmente rica da Ordem de Avis. è possível que tenha ganho algo, também,
com o protagonismo do seu Alcaide Pero Rodrigues da Fonseca "Encerrabodes". Por outro
lado, os Mestres de Avis eram seus donatários... e tinham passado a ser reis.
Já no reinado de D. Manuel I, o Alandroal recebe uma confirmação da sua Carta de Foral
( 1514 ), quando era seu alcaide Diogo Lopes de Sequeira, que foi o quarto governador da
Índia portuguesa e que dotou a vila de um hospital e de outras obras de utilidade pública.
Como sucedeu por todo o Alentejo, o Alandroal viu muitos dos seus filhos participar na
epopeia dos Descobrimentos. A esmagadora maioria mal é recordada. Entretanto, ficaram
monumentos, como a Igreja matriz ( influências renascentistas, entre outras), a Igreja da
Misericórdia (enriquecida posteriormente com elementos barrocos). Um pouco mais antiga
(século XV), encontramos a Ermida de Nossa Senhora das Neves.
Naturalmente, a partir do primeiro quartel do século XVI, a crise que se viveu deve
ter sido nele sentido. O resultado for, por exemplo, a União Ibérica (1580-1640).
Desde muito cedo que o Alandroal teve também fama de ter águas e ares com virtudes
quase medicinais. Muitos forasteiros a demandavam com esse propósito. São dessa época as
principais referências ao facto, ainda que não as mais antigas. A povoação parecia imune,
ou quase, a epidemias. Dizia-se que as matas de aloendros (loendros) podiam ser as
responsáveis.

4) A RESTAURAÇÃO/ANTIGO REGIME

Da época do Domínio filipino pouco se sabe. Há notícias de no Paço dos Alcaides,
dentro do Castelo, ter vivido uma personagem importante, D. Brites de Lencastre, e que aí
casou a sua filha, D. Isabel, com o marquês de Vila Real, D. Miguel de Menezes, em 1604.
A Guerra da Restauração veio, necessariamente, causar transtornos. Fizeram-se alguns
reparos nas muralhas. D. João IV mandou chamar um natural da localidade, António Álvares,
então frade em Braga, para lhe entregar trabalhos de fortificação e o comando da
artilharia.
Em 1656, os espanhóis chegaram a ocupar a vizinha Terena por alguns dias. Combates
violentos se verificaram então. E, em 1657, a ocupação de Olivença pelas forças de Madrid
(até à Paz de 1668) trouxe ao Alandroal centenas de refugiados daquela povoação. Entre
1659 e 1665, ocorreram várias batalhas, as mais violentas da Guerra, a poucos quilómetros
a norte. Tudo isto teve consequências na vida da localidade.
O final do Século XVII e o século XVIII não parece terem perturbado muito a vida
local. Poucos monumentos foram construídos, mas alguns dos existentes receberam
pormenores e acrescentos barrocos.
Por outro lado, a acção repressiva da Inquisição, particularmente sentida no Alentejo
e enfraquecendo nomeadamente uma incipiente burguesia local, não facilitava a busca de
novos caminhos. Ter ideias ou ter demasiada imaginação era perigoso...
Sentia-se, no século XVIII, uma necessidade de racionalização da estrutura
administrativa do País. Por exemplo, para alguns aspectos burocráticos, o Alandroal
dependia da Comarca de Avis, enquanto Terena, Juromenha, Vila Viçosa, e Olivença,
dependiam de Vila Viçosa. Para outros dependia de Elvas. Todos os projectos de Reforma
não tiveram seguimento. Só no fim de século surgiu um projecto que parecia ir ser
implementado
.
5)INVASÕES FRANCESAS/LIBERALISMO

Todavia, novos acontecimentos viriam perturbar a região. A Revolução Francesa agitava
a Europa. Em 1801, a Espanha, apoiada pela França, invadiu o Alentejo (Guerra das
Laranjas), e ocupou a Região de Olivença e a aldeia de Vila Real de Juromenha. O
Alandroal sempre estivera muito ligado às terras perdidas, e, embora a Ponte da Ajuda,
entre Elvas e Olivença, estivesse danificada desde 1709, as economias tinham muita
complementaridade. Logo, houve consequências negativas para o Alandroal. Note-se que,
durante todo o século XIX, muitos oliventinos, abandonando a sua terra de origem, se
vieram a fixar na vila.
As invasões francesas (1807-1811-12) tiveram também influência na região. Em 1808,
houve guerrilhas anti-francesas, e alguns combates de 1811 não se deram longe. Algumas
terras próximas, como Ciladas, sofreram bastante.
O liberalismo e a Guerra Civil (1820-23; 1832-34)deixaram algumas marcas também,
embora não muito relevantes. Alterações, mesmo, deram-se em 1835-36, quando ao Alandroal
foram anexados os extintos Concelhos de Juromenha, Terena, e Ferreira de Capelins, este
último um pequeno município originário da Idade Média.
O novo e alargado município do Alandroal foi integrado no novo “departamento” de
Montes Claros, que logo viu o seu nome mudado para, muito simplesmente, Distrito de
Évora. As ordens religiosas foram entretanto extintas, pelo que muitas propriedades da
região passaram para novos senhores, mantendo-se a estrutura latifundista.
Uma curiosidade se mantém até hoje: o Concelho do Alandroal não tem fronteira
internacional definida entre no Guadiana entre a “boca” da Ribeira de Alconchel/Táliga e
o Concelho de Elvas (onde se verifica a mesma situação, mas num troço ínfimo dos seus
limites). Isto porque Portugal não reconhece a administração espanhola sobre Olivença, e
muito menos sobre a Aldeia de Vila Real, em frente de Juromenha, e que, talvez, devesse
fazer parte do Alandroal. Uma curiosidade, sem dúvida.
A partir de 1852 (Regeneração) notou-se algum progresso (o caminho-de-fero chegou à
vizinha Vila Viçosa, por exemplo) e algum aumento de população, mas poucas reformas de
fundo foram levadas a cabo. A assimetria característica de Portugal, com o aumento de
peso do litoral em relação ao interior, que já vinha do século XVIII, ia-se agravando. E
revelou-se ilusória a sensação de “aumento de poderio” resultante da união num só de
quatro antigos municípios.

6)A REPÚBLICA E O SALAZARISMO

A proclamação da República, em 1910, encontrou algum eco na região, existindo mesmo um
célebre jornal (o “PERO RODRIGUES”) de cariz revolucionário que ficou célebre. Por outro
lado, com o fim da Monarquia, Vila Viçosa perdeu importância, e é provável que o
Alandroal, a dez quilómetros, se ressentisse um pouco disso mesmo.
Algumas tentativas de modernização, meritórias, foram feitas, instalando-se mesmo uns
rudimentos de Indústria, predominantemente ligada à agricultura e à criação de gado.Assim
surgiram duas fábricas de moagem. Manteve-se, todavia, o predomínio do latifúndio, que o
Estado Novo (1926-1974) não pôs em causa. Infelizmente, tal modelo, a que as campanhas do
trigo do Regime não trouxeram a médio e longo prazo nenhuma melhoria, estava esgotado por
volta de 1950. As actividades tradicionais ao longo do Guadiana não tiveram também
energia para evoluírem e abrir novos caminhos de progresso.
A partir da década de 1950, a população, que fora crescendo (quase 11 000 habitantes
em 1950), conheceu um movimento contrário. A emigração tornou-se um flagelo. O
descontentamento social, principalmente entre os assalariados agrícolas, apesar da
repressão, ia-se tornando evidente, e que se reflectiu, depois de 1974, num predomínio
eleitoral comunista até quase ao ano 2000

7) TEMPOS ACTUAIS

De uma forma ou de outra, o 25 de Abril de 1974 abriu novas portas. Tentou-se uma
Reforma Agrária, algo incipiente, que encheu de esperança muita gente. Contudo, por volta
de 1980, tudo estava praticamente terminado. As esperanças passaram para a conclusão da
Barragem do Alqueva e para as potencialidades que esta iria desenvolver.
A entrada na União Europeia também foi vista como positiva. A colaboração com Espanha
tornou-se mais fácil, e esboçaram-se projectos comuns. Continua a ser difícil, contudo,
produzir riqueza com origem na região, para que não se caia em situações de
subalternização e dependência, o que é difícil dada a política tradicional do Poder
Central, que mantém as regiões periféricas, e portanto o Alandroal, numa situação de
marginalidade. O encerramento das ligações ferroviárias (caso da de Vila Viçosa, útil
para a vila) e o constante encerramento de serviços por todo o País são disso um exemplo.
A população do Município tem vindo a diminuir. Em 1991, pouco ultrapassava os 7 000
habitantes, e a tendência mantém-se (6 400 habitantes em 2002).
A inauguração de uma nova Ponte sobre o Guadiana, em 11 de Novembro de 2000, entre
Elvas e Olivença, pouco tem beneficiado o Alandroal, histórica e tradicionalmente, como
vimos, muito ligado a este Concelho, pois não existe ainda (apesar de prometida desde
sempre!) uma ligação directa à nova infra-estrutura. É ridículo ter-se de ir do
Alandroal a Elvas para se aceder à estrada para a referida Ponte, avistando-se por vezes
a mesma pelo caminho sem que se possa chegar directamente a ela. Um absurdo!
O Alandroal procura fazer das fraquezas forças. Assim, procura aproveitar o facto de
no seu território actual se contarem três castelos (Alandroal, Terena, e Juromenha), e um
extraordinário santuário pré-histórico e romano (Deus Endovélico, em terras de Terena),
para se projectar turisticamente. Procura-se também levar a cabo eventos com ecos
transconcelhios. Por outro lado, o Alqueva, já concluído, é visto como uma nova
oportunidade para a agricultura e para o desenvolvimento em geral... havendo a lamentar,
todavia, o fim de toda uma série de actividades, algumas milenares, ligadas ao Guadiana.
Todavia, se o projecto for explorado com sabedoria, terá valido a pena. Críticos há,
contudo, que são da opinião de que as águas do novo lago estão a ameaçar ser exploradas
de forma errada, olhando-se mais para lucros imediatos, talvez precários a médio e longo
prazo, do que para formas de desenvolvimento sustentado, previstos originariamente.
Espera-se que o Alandroal saiba encontrar caminhos prósperos para o futuro. Isso
dependerá, em primeiro lugar, de si próprio, e, depois, de políticas correctas, racionais
mas humanistas, a incentivar pelo Poder Central.
Termino com uma quadra popular, ouvida aqui e além, onde se homenageia a fonte
monumental, com seis bicas e brasão do século XVIII, orgulho da vila:

Bonita cidade é Elvas,
que tem Badajoz defronte,
mais bonita é Landroal,
que tem seis bicas na Fonte!

Estremoz, 21 de Dezembro de 2007
Carlos Eduardo da Cruz Luna

JUROMENHA



HISTÓRIA DE UMA ANTIGA VILA DE FRONTEIRA : JUROMENHA

1) Introdução

A história pode ser madrasta, mesmo no vale do Guadiana. O rio e seus
afluentes convidam o Homem a instalar-se nas suas margens, ou próximo delas.
Com bons resultados, quase sempre. Mas... acontecimentos diversos podem
influir no desenvolvimento normal e no progresso dos aglomerados humanos.

2) Juromenha (até ao século XVI)

A fortaleza abandonada de Juromenha, sobre o Guadiana, 18 km a nordeste do
Alandroal, 16 km a sudoeste de Elvas, 17 km a leste de Vila Viçosa, e 11 km
a noroeste de Olivença, impressiona pela sua dignidade fantasmagórica.
A sua origem perde-se na noite dos tempos. Sem provas, quer-se que tenha
sido fundada por galo-celtas, por volta de 400 a.C. Embora existam vestígios
romanos, é muito improvável que tenha sido fundada por Júlio César em 50
a.C., com o nome de “Julii Moenia” (Muralhas de Júlio). Outra lenda dá-a
como fundada pelos visigodos, onde estaria a origem do seu nome, numa
princesa de nome Menha a quem um irmão queria arrancar um juramento
indecoroso (- Jura, Menha, que não!). Tal lenda não é digna de crédito,
independentemente da sua beleza, pois surge muito depois da fixação do
topónimo.
Nos tempos muçulmanos, foi uma cidade importante, cujo nome seria, segundo
alguns, “Chel-Mena”. Mas o topónimo árabe mais provável terá sido o de
“Yulumaniya” ou “Julumaniya”, uma, repete-se, cidade moura importante, e
nele se deverá ver a origem mais provável do termo JUROMENHA, que conheceu
algumas variantes, como Jeremenha, Gerumenha, ou Jorumenha.
Não se pode pôr de lado a hipótese de a forma árabe Yulumaniya derivar de
“Julli Moenia” (Muralhas de Júlio)... se acaso tal lenda (a da origem
romana) já existia no século VIII !
D. Afonso Henriques terá conquistado a povoação em 1167. D. Gonçalo Viegas,
filho ou sobrinho de D. Egas Moniz, talvez já no tempo de D. Sancho I,
tê-la-á recebido em doação, atravessando então o Guadiana e ocupando o
lugar de Vila Real, embora pouco se saiba sobre a veracidade destes factos.
Os muçulmanos reocuparam a região, decerto entre 1169 e 1189, já que a data
de 1242 referida em algumas enciclopédias como de “conquista moura”, estará
decerto errada, pois sabe-se com razoável certeza ter o fidalgo D. Paio
Peres Correia ocupado definitivamente a região por volta de 1220, 1230 o
mais tardar. Em 1242, já os mouros estavam muito, muito longe.
Após a pacificação da fronteira em 1297 (Tratado de Alcañices), D. Dinis
mandou reedificar as muralhas e o castelo de Juromenha, dando-lhe foral em
1312. As suas terra ficaram dentro da área atribuída à Ordem de Avis.
Sem dúvida que no século XIV teve assinalável importância, nela se
efectuando três casamentos reais: o de D. Afonso IV com D. Beatriz de
Castela, ainda no século XIII e a rematar o já citado Tratado de Alcañices;
o de D. Maria de Portugal com Afonso XI de Castela em, 1328; e o de D. Pedro
I com D. Constança de Castela em 1340.
Durante a crise de 1383-1385, Juromenha não parece ter desempenhado nenhum
papel de realce, pois raramente é referida, o mesmo ocorrendo no século XV.
Podemos, todavia, estar a ser enganados por eventual destruição de
documentos. De qualquer forma, não deverá ter perdido importância, pois D.
Manuel I concedeu-lhe, em Lisboa, novo Foral, em 15 de Setembro de 1512. As
muralhas, por essa época, eram grandiosas, com 17 torres, sendo uma delas
uma Torre de Menagem com 140 palmos (cerca de 30,8 metros) de altura.
No Numeramento de 1527-1573, o mais antigo de Portugal, Juromenha surge como
tendo 150 fogos (pouco mais de 600 habitantes, ao que se julga), portanto
bastante menos que as vizinhas Elvas (1916 fogos, cerca de 7000
habitantes), Alandroal (284 fogos, cerca de 1100 habitantes), Olivença (1053
fogos, cerca de 4000 habitantes), Vila Viçosa (talvez 800 fogos e cerca de
3000 habitantes), Estremoz (969 fogos, aproximadamente 3200 habitantes) e
Borba (600 fogos, cerca de 2300 habitantes). Igualava, todavia, Terena (170
fogos, talvez 650 habitantes).
A importância de Juromenha era essencialmente militar e estratégica,
protegendo, à retaguarda, Olivença, uma urbe alentejana que, cercada por
Castela/Espanha por três lados, constituía sempre um quebra-cabeças para as
chefias militares portuguesas. As terras do Concelho ultrapassavam aliás o
Guadiana, pois pertencia-lhe o lugar de Vila real, exactamente a sua melhor
área agrícola.

4) Juromenha (1640-1801)

O período das Guerras de Restauração aumentou o papel de Juromenha, e D.
João IV ampliou-lhe e modernizou-lhe as fortificações, que passaram a ser em
estilo “Vauban”. Em 1657, recebe milhares de oliventinos fugidos da sua
vila, então ocupada pelo inimigo, à qual só regressaram em 1668, quando a
administração portuguesa foi reinstaurada.
Juromenha resistiu sempre durante a Guerra de 1640-1668, registando-se nela
um triste evento em 19 de Janeiro de 1659, quando explodiu por descuido um
armazém de pólvora, perecendo então toda a guarda ali aquartelada, composta
por estudantes de Évora capitaneados pelo Padre Francisco Soares (conhecido
por “o Lusitano”).
Em 1709 (Guerra de Sucessão de Espanha) travaram-se combates nas
proximidades, e ainda ao longo de todo o século XVIII a Praça de Juromenha
foi alvo de constantes cuidados.
É evidente que, em todas estas guerras, toda a zona fronteiriça (raiana),
tanto do lado português como espanhol, sofreu consideráveis destruições. O
desenvolvimento é, necessariamente, inimigo da guerra.
O conflito seguinte, no início do século XIX, irá, uma vez mais,
demonstrá-lo.

5) 1801, Data Incontornável

A Guerra das Laranjas levou à conquista da Vila de Juromenha em 20 de Maio
de 1801. Alguns meses depois, foi devolvida pelos espanhóis, mas sem a parte
do Concelho a leste do Guadiana, com a aldeia de Vila Real, aliás a mais
rica em termos agrícolas desde sempre.
Ainda em 1837 Juromelha era considerada uma fortaleza de Primeira Classe,
com uma forte guarnição militar, mas o declínio acelerou-se a partir de
então. A meio do século XIX, deixava mesmo de ser sede de Concelhos,
passando a depender do Alandroal.
Os delicados problemas ligados à inexistência oficial de fronteira na
região, resultantes da questão em aberto de Olivença, fizeram-se sentir
duramente. Durante algum tempo, alguns oliventinos procuravam escolarizar-se
em Juromenha, mas em breve a vigilância espanhola, em especial na época
franquista, tornou tal quase impossível.

6) Os limites do concelho de Juromenha e a Ponte da Ajuda

Mas, afinal, quais eram os limites do extinto Concelho de Juromenha a leste
do Guadiana ?
Um trabalho recente, de autoria de Mário Rui Simões Rodrigues, de Leiria,
baseado em vários documentos, nomeadamente um mapa de 29 – Janeiro – 1802,
existente no “Servicio Historico Militar” em Madrid, procura demonstrar que,
muito provável e inesperadamente, a Ponte da Ajuda, que ligava Elvas a
Olivença, deveria, para lá do Guadiana, assentar em terras do termo de
Juromenha. As investigaçõs do oliventino Miguel Ángel Vallecillo Teodoro, ao
demonstrar, no seu livro “Olivença en su Historia”, que as herdades de
Malpica de Portugal e Joana Castanha, cujo limite norte era a fronteira da
Ribeira de Olivença, pertenciam a Vila Real, freguesia do concelho de
Juromenha, reforçam esta conclusão.
Sabe-se que a Ponte da Ajuda, construída no reinado de D. Manuel por volta
de 1520, se destinava a pôr em contacto as 6ª (Elvas) e 13ª (Olivença)
maiores povoações portuguesas. Com os seus 450 metros, 18 arcos, e quase 6
metros de largura, esta ponte, parcialmente destruída em 1709, durante a
Guerra da Sucessão de Espanha, é, ainda hoje, uma obra impressionante.
Inevitavelmente, a polémica Luso-espanhola sobre as terras de Olivença
tem-se reflectido no adiamento constante da sua recuperação. As dificuldades
e as contradições diplomáticas não cessam. Note-se que, desde 1967, a Ponte
foi declarada Monumento de interesse Nacional pelo Estado Português.
No que respeita ainda a limites, Portugal não cessou de reclamar contra a
ocupação de parte do concelho de Juromenha, em 1801, pela Espanha, contrária
ao Tratado de Badajoz, independentemente de Portugal considerar este anulado
desde 1807.
Com efeito, no Tratado de 1801 fala-se em colocar os limites fronteiriços no
Guadiana, mas “... naquela parte que UNICAMENTE toca ao sobredito território
de Olivença.” (Artigo III)
Vila Real, a aldeia que, segundo a lenda, foi fundada por Gonçalo Viegas,
que quis recordar Vila real de Trás-os-Montes (sendo mais provável que o
nome se deva a existirem ali terras da Coroa Portuguesa), bem como toda a
área que lhe pertencia a oriente do Guadiana, foi pois anexada em violação
do Tratado de Badajoz.

7) Juromenha : declínio, um triste destino

Juromenha não se limitava a sofrer pela amputação de parte do seu
território. As desgraças sucediam-se. Epidemias de febres (“sezões”)
afugentavam a população. No princípio do século XX, um surto de peste
bubónica afugentou as poucas gentes que tinham ficado. Mais tarde, surgiu um
povoado novo, fora das muralhas, e as ruínas de Juromenha passaram a ser
utilizadas como palheiros e currais. Distinguem-se, ainda, a antiga Câmara e
a Casa do Senado, bem como as capelas da Misericórdia e de São Francisco de
Assis. Da antiga cadeia, quase só resta um colorido brasão. Por vezes, e
cada vez mais, distinguir estes antigos edifícios exige um grande esforço de
imaginação.
Durante a Guerra Civil de Espanha (1936-1939), por ali passaram alguns
refugiados, que as autoridades portuguesas procuravam deter para,
conscientemente, os entregarem à desumana repressão franquista.
A população da nova Juromenha extra-muros tem vindo a diminuir desde o meio
do século XX, com alguns movimentos ocasionais insuficientes para
contrariar a tendência: 1399 habitantes em 1950, 1453 em 1960, 929
habitantes em 1970. e, em 1991... 181 habitantes apenas !
A situação de fronteira administrativa, mas não legal, no Guadiana, não lhe
permitiu ter uma verdadeira alfândega, embora funcionasse às vezes um muito
pequeno posto de estatuto indefinido. A sua Feira Anual, em 10 de Agosto,
sob o seu antigo Orago de Nossa Senhora do Loreto, é muito modesta.
Juromenha é, fundamentalmente, uma ruína grandiosa. Um certo medo do local e
das suas antigas epidemias subsistiu até 1940, já que num guia com essa data
se aconselhava a eventuais visitantes o cuidado de se preveniram com
quinino.
A falta de água é um dos dramas do povoado, e é um problema muito antigo. E,
todavia, era relativamente rica de trigo em volta, em especial
além-Guadiana, e de madeira de queima, pelo que há memória de um ditado
popular significativo (“Juromenha, Juromenha, // boa de trigo, e melhor de
lenha”).
Para visitar a fortaleza de Juromenha, segundo informações de 1996, tem de
se pedir a chave no novo povoado de Juromenha fora das muralhas.
E o visitante logo concluirá que a actual situação de abandono não pode
continuar. A fortaleza está ainda razoavelmente bem conservada, fazendo jus
ao antigo brasão da Vila (uma torre de muralha, dentro de água, encimada por
correntes), mas as ruínas do interior em breve não passarão de uma camada de
pó. Urge, pois, salvar os maltratados monumentos, reconstruí-los,
restaurar tanto quanto possível o traçado urbano, e fazer da fortaleza
fantasma um lugar de vida, talvez um ponto turístico, quiçá uma pousada, e
outras atracções. Há notícias de que se começa a pensar em qualquer coisa.
Qualquer solução será benvinda, mas o abandono actual não pode ter perdão.
O que poderá fazer para acudir a esta região, progressivamente abandonada,
onde as pedras carregadas de história têm cada vez menos homens por
companhia ? Fica a interrogação para quem de direito responder.

Estremoz, revisto em 08 de Janeiro de 2006
Carlos Luna ( Carlos Eduardo da Cruz Luna)

CULTURA ALENTEJANA E PORTUGUESA



A VELHA CULTURA ALENTEJANA (ANTES QUE DESAPAREÇA)
SÓ EM PORTUGUÊS E NUMERADAS: UM TRABALHO ÉPICO DE DOIS DIAS (POESIA TRADICIONAL
OLIVENTINA: 94 QUADRAS, AS PRIMEIRAS 76 RECOLHIDAS POR VENTURA LEDESMA ABRANTES

UM TRABALHO ÉPICO DE DOIS DIAS (POESIA TRADICIONAL OLIVENTINA: 94
QUADRAS, AS PRIMEIRAS 72 RECOLHIDAS POR VENTURA LEDESMA ABRANTES(décadas de 1930 e
1940)), 2 de dois habitantes de São Jorge de Alor na década de 190, as últimas 20
recolhidas pelo Prof. Hernâni Cidade, na década de 1950 e 1960

1-Ó Vila Real dos coxos,/
São Bento dos aleijados,/
São Domingos dos bons moços,/
São Jorge dos mal talhados

2-A fonte do Val de Gral /
está no alto da Serra d´Olor./
É água que a ninguém faz mal,/
e dali bebe o meu amor.

3-O meu coração é teu,/
o teu é de quem tu queres./
Uma troca faria eu,/
lindo amor, se tu quiseres.

4-Se eu tivesse não pedia/
coisa nenhuma a ninguém./
Mas, como não tenho, peço/
uma filha a quem a tem.

5-Daqui para a minha terra/
tudo é caminho e chão!/
Tudo são cravos e rosas/
postos pela minha mão.

6-Silva verde não me prendas/
que eu não tenho quem me solte;/
não queiras tu, silva verde,/
ser causa da minha morte.

7-Azeitona pequenina/
também vai ao lagar;/
eu também sou pequenina/
mas sou firme no amar.

8-Saudades, tenho saudades,/
saudades das feiticeiras./
Lembrança das amizades/
da "Terra das Oliveiras".

9-A laranja quando nasce/
logo nasceu redondinha;/
tu também quando nasceste,/
nasceste para ser minha.

10-Na vila de Olivença/
não se pode namorar!/
As velhas saem ao Sol/
e põem-se a criticar!

11-Tenho corrido mil terras,/
cidades mais de quarenta,/
tenho visto caras lindas,/
só a tua me contenta.

12-Adeus largo do Calvário,/
por cima, por baixo não./
Por cima vão os meus olhos,/
por baixo, meu coração.

13-O Monte de Santa Maria/
tem vinte e quatro janelas.
Quem me dera ser pombinho/
para pousar numa delas.

14-Esta noite choveu neve/
no gargalo do meu poço;/
todas as rosas abriram/
menos o meu cravo roxo.

15-Abalei da minha terra,/
olhei para trás chorando./
Adeus terra da minha alma,/
que longe me vais ficando.

16-Eu sou ganhão da ribeira,/
da ribeira sou ganhão./
Lavro com dois bois vermelhos/
que fazem tremer o chão.

17-Ó minha mãe, minha mãe,/
companheira de meu pai!/
Eu também sou companheira/
daquele cravo que ali vai!

18-Eu tenho uma silva em casa/
que me chega à cantareira./
Busque meu pai quem o sirva/
que eu não tenho quem me queira.(/)
(mais lógico: que eu já tenho quem me queira.)

19-O Sol, quando nasce, inclina/
nas barrancas do Guadiana./
Eu também ando inclinado/
nesses teus olhos, Mariana!

20-Eu já vi um valentão/
à briga com uma cidade;/
logo ao primeiro encontrão/
derrubou mais de metade!

21-Eu sou guarda no Freixial,/
lá nas bandas do Guadiana./
Já matei um pato real/
com uma espingarda de cana.

22-Quando eu era pequenino,/
ainda não sabia andar,/
já minha mãe me dizia/
"que fino é para namorar".

23-Fui à Serra colher trevo,/
ancontrei o trevo colhido./
Estou se sim ou não me atrevo/
a arranjar amores contigo.

24-Quem me dera, dera, dera,/
quem me dera, dera, dar,/
beijinhos até morrer,/
abraços até cansar.

25-Quando eu principiei a amar/
de amores não entendia;/
agora já fiquei mestre/
daquilo que não sabia.

26-Cantigas são pataratas,/
às vezes leva-as o vento./
Quem se fia de cantigas/
é falto de entendimento.

27-Já lá vai Abril e Maio,/
já lá vão esses dois meses,/
já lá vai a liberdade/
que eu tinha contigo às vezes

28-Eu quero bem, mas não me queres/
dizer a quem quer(es) bem./
Eu quero bem a uma ingrata,/
dizê-lo não me convém.

29-Eu quero contigo passas,/
eu quero contigo figos,/
eu quero que tu me faças/
o que eu fizer contigo.

30-Margarida, a tua vida/
não a contes a ninguém,/
que uma amiga tem amigos,/
e outra amiga, amigos tem.

31-Lindos olhos tem meu par,/
ainda agora reparei./
Se reparasses mais cedo,/
verias como eu amei.

32-Meu amor, meu amor,/
meu amor, nada é vão!
Eu dou-te a minha vida,/
tu dás-me o teu coração.

33-Os meus olhos com chorar/
fizeram covas no chão.
Coisa que os teus não fizeram,/
nem fazem, nem farão.

34-Se eu soubesse que voando (Pronúncia tradicional:"qu´avoando")/
alcançava os teus carinhos,/
mandava fazer umas asas/
de papel encarnadinho.

35-Toda a vida fui pastor,/
toda a vida guardei gado;/
tenho uma chaga no peito/
de me encostar ao cajado

36-Pombinha, "avoa", "avoa" (=voa, voa),/
que está caçador na horta./
Em pondo a espingarda à cara/
logo a pombinha cai morta.

37-Não esmoreças, cão carocho,/
que amanhã tens "fartadela" (=abundância);/
já morreu o filho mocho,/
filho da cabra amarela.

38-Meu amor, lá de longe,/
lá de longe me mandou/
um lencinho molhadinho/
das lágrimas que chorou.

39-Camarada, amigo meu,/
não vivas apaixonado./
Quem teve a culpa fui eu,/
eu é que fui o culpado.

40-Teu pai e tua mãe não querem/
lindo amor que eu te logre;/
queiras tu e queira eu,/
que com amor ninguém pode!

41-Quando eu era pequenino/
que jogava o "repião"(pião)/
davam-ma as moças beijinhos;/
agora já não me dão!

42-O meu amor ontem à noite/
a sua vida me contou,/
e que se ia deitar a um poço.
Se ele vai, eu também vou!

43-Meu amor quer que tenha/
juízo e capacidade./
Tenha ele que é mais velho,/
já vai caindo na idade.

44-Homem alto e delgadinho/
é a minha inclinação,/
que aqueles que são baixinhos/
nem para ver a Deus são.

45-Fita verde no chapéu,/
ao longe mete aparência./
Quantos amores se perdem/
pela pouca "diligência".(=cuidado na aparência)

46-És branca como o leite,/
corada como a cebola;/
amores, quantos quiseres,/
casar contigo,... xó rola!

47-Minha mãe ouviu lá fora/
tu jurares devagarinho,/
dizer-me que me querias/
e roubares-me um beijinho!

48-Eu prometo voltar breve,/
ir de joelhos à cidade,/
se me sares da doença,/
Nosso Senhor da Piedade.

49-Eu também já fui à festa/
e fiz promessas a Deus
de voltar no Ano Novo
a dançar no São Mateus.

50-Tenho o coração negrinho/
deitado neste teu peito;/
não fales alto-baixinho/
assim é que me dás jeitinho.

51-Eu já não gosto de ti,/
tenho o coração sovado./
Tenho agora amores novos/
deixei já os teus cuidados.

52-Adeus, que me vou embora/
para a terra das andorinhas;/
deita cartas no correio/
se quiseres novas minhas

53-O meu amor é aquele/
que não tira o chapéu;/
passa por mim, não me fala,/
mostra-me cara de réu.

54-Estreei minha saia nova,/
minha blusa, meu vestido./
Levarei tudo para a cova/
se não queres ser meu marido.

55-Não posso ser teu marido/
ainda que tu digas "sim";/
vê lá tu, meu querido,/
como as coisas são assim.

56-Se tu souberas bem ler/
nos meus olhos o feitiço,/
verias como se quer/
a paixão ao seu derriço.(=anamorado)

57-Baila, não cantes tanto,/
que o bailar é espavento;/
as cantigas que eu canto/
não são cantigas ao vento.

58-Porque esperas, meu bom moço,/
que eu viva tão requeimada?/
Só se fores como o poço:/
muita água... e não tem nada!

59-Alto lá, meu bem formoso,/
não digas isso a cantar!/
És um pau carunchoso,/
e não te posso aguentar!(=suportar)

60-Olha bem para o meu peito,/
onde está o coração;/
vê lá se disto há direito,/
diz-me agora: sim ou não!

61-Acabou-se a brincadeira,/
não metas mais a colher!/
Bate agora à dianteira,/
que tu vais ser minha mulher!

62-Anda cá para os meus braços/
se tu vida queres ter,/
que os meus braços dão saúde/
a quem está para morrer!

63-Os olhos daquela aquela,/
os olhos daquela além,/
os olhos daquela flor/
são os olhos do meu bem!

64-O meu amor é um cravo/
que ao craveiro fui colher;/
para o craveiro dar outro/
tem de voltar a nascer.

65-Não há luar mais formoso/
que o da noite de São João,/
nem luz que mais ilumine/
o meu pobre coração!

66-Comprei arrecadas de ouro/
na feira de São Mateus;/
lembranças do meu tesouro/
e dos beijos que ele me deu.

67-António, meu oratório,/
meu espelho de vestir;/
quem tem amores com António/
volta ao céu e torna a ir!

68-Minha mãe, quando eu casei,/
prometeu-me quanto tinha./
Depois que me viu casada/
deu-me um saco de farinha!

69-O coração já está preso,/
não cantes mais "soledade" (=solidão)./
Já o virei do avesso/
para curar a saudade.

70-Já morreu o vil traidor,/
para os infernos muitos anos;/
quis vender o nosso povo/
ao poder dos castelhanos.(*)

71-Cosmander foi um vilão/
ao serviço dos "mariolas",/
mas teve morte de cão/
com sepultura de esmola.(**)

72-Era um diabo, um malvado,/
sem honra nem coração;/
dorme, filho, descansado,/
que já morreu esse cão!(***)

((*), (**), (***)- referências a João Pascácio Cosmander, ou Jan Ciermans, um flamengo
(belga ou holandês) que, estando ao serviço do exército português em 1640, resolveu trair
e por-se do lado de Castela. Tentou um ataque traiçoeiro a Olivença, mas foi morto pelo
oliventino Gaspar Martins)

73-As mocinhas lá em São Bento,/
todo o seu traje é um:/
sapatos de cinco bicos,/
e as meias da cor do cu. (ouvida em São Jorge, 1991, a Eduardo Godinho)

74-Toda a mulher que é bonita/
não devia de nascer./
É como a pera madura,/
todos a querem comer! (ouvida em São Jorge, 1992, a Severiano Nunes)

_______________________________________________________________________________
OUVIDAS POR HERNÂNI CIDADE, NAS DÉCADAS DE 1950 E 1960, EM OLIVENÇA

75-Brinca, menina, brinca,/
não tires os sapatinhos,/
que a água está gelada/
e espantas os borreguinhos

76-As flores do meu canteiro/
dizem-me todos os dias/
as conversas que tu tens/
sem esquecer as picardias.

77-Cheguei agora da horta/
com um braçado de flores,/
Deus bem sabe que eu vinha/
pensando nos meus amores./

78-Falei contigo uma noite/
e não sei como te via,/
os teus olhos tinham luz/
e a noite parecia dia.

79-Vesti ontem saia nova,/
fui logo fazer promessa./
O Padre ralhou comigo
gritando: «Não tenha pressa»!

80-Sonhei contigo uma noite,/
pensando que me querias./
Despertei toda assustada/
sem saber o que dizias.

81-Sou leiteira, vendo leite,/
também vendo requeijão./
Falarei ao meu amor/
Quando tenha ocasião.

82-O Amor enquanto é novo/
ama com todo o cuidado./
Depois que vai para velho,/
mostra papel de enfadado.

83-Vamos cantar os Reis/
à porta do lavrador,/
que tem a mulher bonita/
e a filha que é uma flor.

84-Ao poço da tua rua/
fui ontem beber água./
Tinha secado de noite/
com pena da minha mágoa.

85-Vi-te à janela uma noite/
chorando penas, aflita./
A Lua batia no rosto/
mostrando a tua desdita.

86-Meu coração chora sempre/
as lágrimas de uma santa;
são queixumes portugueses/
que se ouvem na barranca.

87-Canta alegre o coração,/
canta bem a despedida;/
já não têm luz nem morrão/
os olhos da minha vida.

88-Romeiro dos meus amores,/
Deixa cantar a canção;/
são tristezas e são flores/
que saem do coração.

89-Adeus, perfumes e flores,/
Azeite da minha candeia,/
adeus flores dos meus amores,/
adeus casinhas da aldeia.

90-Dos beijos que me destes/
guardo o bafo no coração./
Quando fores ao Guadiana/
ouve bem esta canção.

(REPETIDA:)
91-Saudades, tenho saudades,
saudades das feiticeiras.
Lembrança das amizades
da "Terra das Oliveiras".

92-Doce Jesus da minha alma,/
doce Jesus da minha vida,/
quando chegará a hora/
da minha doce partida?

93-Oh, senhores, eu vi-a Coxa/
Lá no largo do Rossio,/
com uma canastra à cabeça/
vendendo o belo safio.

94-O safio estava podre,/
estava podre e não se vendia,/
e a pobrezinha da Coxa/
em vez de ganhar, perdia





O QUE SE SEGUE É UM ESFORÇO, QUASE DESCONHECIDO, DE RECUPERAR CULTURA ALENTEJANA E PORTUGUESA, A QUE JORNAIS E REVISTAS, MESMO OS DA ESPECIALIDADE, NÃO LIGAM (AINDA QUE INFORMADOS)
PODE-SE PENSAR O QUE SE QUISER DA "QUESTÃO DE OLIVENÇA", TUDO BEM! MAS...DESPREZAR A CULTURA? UM ESFORÇO LUSÓFONO? DE UM ESPAÇO ALENTEJANO? POR FAVOR, O PRECONCEITO, AQUI, PRODUZ ALGO QUE NÃO ANDA LONGE DA CENSURA!

TRÊS ANOS DE ACTIVIDADE: O "ALÉM GUADIANA"

TRÊS ANOS DE ACTIVIDADE: O "ALÉM GUADIANA"
por Carlos Luna
(RESUMO DE ACONTECIMENTOS DE TRÊS ANOS: 2008-2011)
A INESPERADA RECUPERAÇÃO DO PORTUGUÊS/ALENTEJANO EM OLIVENÇA

INTRODUÇÃO

Portugal é um País de contradições. Ambiciona ser conhecido,
reclama que a sua cultura
é pouco divulgada... mas, contraditoriamente, parece envergonhar-se de assumir
manifestações concretas da sua cultura.
Desde 2008 ( em Março de 2011, celebra-se o terceiro aniversário),
algo de novo surgiu
no panorama cultural português...
ou, se se quiser,
lusófono. Previamente, a União Europeia chamou a atenção para a falta
de protecção de que
a Língua Portuguesa era vítima por parte do Estado Espanhol em
Olivença e Táliga (antiga
aldeia de Olivença.Mais importante, na própria Olivença, um grupo de
locais fundou a
Associação "Além
Guadiana", que, sem
se preocupar com a questão, que se mantém, algo discretamente, sobre a
soberania legal
(ou efetiva) sobre a Região, decidiu meter "mãos à obra", e começar a
lutar pela
recuperação da sua cultura e da sua História. Entenda-se: Cultura e
História portuguesas.
Menos de um ano sobre a sua fundação, o grupo conseguia, em 28 de
Fevereiro de 2008,
organizar uma "Jornada do Português Oliventino", que decorreu na
Capela do Convento
português de São João de Deus (em Olivença, naturalmente).
Quer se queira, quer não, fez-se História: pela primeira vez desde 1801,
a Língua Portuguesa manifestava-se livremente em Olivença, com a
"cobertura" das
autoridades espanholas máximas a nível local e regional.
Quase 200 pessoas foram testemunhas disso, entre as quais o
arqueólogo Cláudio
Torres, o "herói" do mirandês Amadeu Ferreira, e outros!
Vale a pena fazer um resumo do que então se passou.

A JORNADA DE FEVEREIRO DE 2008

Falou primeiro o Presidente da Junta da Extremadura espanhola,
Guillermo Fernández
Vara. Curiosamente, um oliventino. Foi comovente ouvi-lo confessar
que, na sua casa paterna, o Português era a língua dos afectos. O
Presidente da Câmara
de Olivença, Manuel Cayado,falou em seguida.
Joaquín Fuentes Becerra, presidente da Associação "Além
Guadiana", destacou e
insistiu no aspecto cultural da Jornada.
Juan Carrasco González, um conhecido catedrático, falou depois.
Seguiu-se Eduardo Ruíz Viéytez,Consultor do Conselho da Europa,
que explicou as
recomendações críticas deste, ao Estado Espanhol, em relação ao
Português de Olivença.
Falou depois Lígia Freire Borges, do Instituto Camões, que destacou o
papel da Língua Portuguesa no mundo. Após o almoço, foi a vez de
ouvir a voz de alguns oliventinos, em Português, bem alentejano no
vocabulário e no
sotaque, não faltando críticas e denúncias de situações de repressão
linguística não muito longe no tempo.
Falram depois Domingo Frade Gaspar (pela fala galega) e José
Gargallo Gil (Línguas
minoritárias).
Seguiu-se Manuela Barros Ferreira, da Universidade de Lisboa, que
relatou a experiência significativa de recuperação do Mirandês.
Falou finalmente o Presidente da Câmara Municipal de Barrancos, a
propósito dos projectos de salvaguardar o dialecto barranquenho.
No final, foi projectado um curto filme sobre o Português
oliventino, realizado por
Mila Gritos (Milagros Rodrígues Perez). Nele surgiam
oliventinos a contar a história de cada um, sempre em Português.
Deu por encerrada a sessão Manuel de Jesus Sanchez Fernandez, da
Associação Além-Guadiana.
Os assistentes e os promotores da Jornada
abandonaram o local, já de noite, convictos de que tinham assistido a
algo notável.
Estava dado um passo de gigante para a recuperação de cultura
lusa em Olivença.
Cerca de um ano, um pouco mais, depois, nova surpresa!

TOPONÍMIA EM PORTUGUÊS

A Câmara Municipal de Olivença decidiu começar a recuperar os
antigos nomes em
português das ruas da localidade. A iniciativa partiu, claro, da
associação cultural Além
Guadiana, apresentou à Câmara e aos diferentes representantes
políticos de Olivença um
projeto pormenorizado para a valorização da toponímia oliventina, com
unânime aceitação.
O projeto, com início a 12 de Junho de 2010, e que prossegue,
estando já quase
conluído em Janeiro de 2011, contempla a adição dos antigos nomes das
ruas aos atuais,
mantendo a mesma tipologia e estética nas placas. Assim, resgatam-se
as denominações das
ruas, dos becos,das calçadas, etc., que configuram o conjunto
histórico encerrado nas
muralhas
abaluartadas, com um total de 73 localizações.
Recorde-se que a maior parte da toponímia urbana de Olivença foi
ubstituída ou
modificada na primeira metade do século XX, embora quase todos os
nomes continuassem a
ser utilizados pela população apesar das alterações, como nos casos da
rua da Rala, da
rua da Pedra, da Carreira, etc.
A Associação "Além Guadiana", num comunicado, esclarecia: «os
antigos nomes das ruas
falam-nos do passado português da "Vila", como popularmente é
conhecida a cidade, desvelando aspetos diversos, amiúde desconhecidos,
da sua história.
Estes remontam a séculos atrás, muitos deles à Idade Média, aludindo a
pessoas ilustres
da História, a antigos grémios de artesãos, a santos objeto da devoção
popular ou à
fisionomia das ruas, entre outros aspetos. "A rua das Atafonas, a
Calçada Velha, o
Terreiro Salgado e o beco de João da Gama" são alguns exemplos.»
Mais dizia a comunicado. «Com esta iniciativa pretende-se, enfim,
realçar um
interessante componente da rica herança cultural oliventina, a
toponímia, contribuindo
para testemunhar a história partilhada deste concelho e para a tornar
visível em cada
recanto intramuros. Os nomes ancestrais dos espaços públicos conformam
uma janela que
convida a assomar-se e a explorar a apaixonante história de Olivença.
Expressados na sua
originária língua
portuguesa, constituem o testemunho vivo de uma cidade onde se
respiram duas culturas e
são um veículo que encoraja os mais novos a manter a língua que ainda
falam as pessoas
mais velhas do município. Para a associação Além Guadiana, trata-se de
uma iniciativa com
fins didáticos, culturais e turísticos, com a qual se resgata para o
presente uma parte
do passado oliventino.»
(CONTINUA)

UMA ESPÉCIE DE «DIA DE PORTUGAL»... DOIS DIAS DEPOIS

A inauguração das primeiras ruas com os nomes em Português, teve
lugar no meio de uma
espécie de festival promovido pela Associação citada, denominado
«Lusofonias». No sentido
de promover a cultura e a língua portuguesa, a organização do evento
elegeu como imagens
promocionais da iniciativa Amália Rodrigues, Fernando Pessoa e Vasco da Gama.
A "Além Guadiana" justificou estas escolhas: «São ícones de
Portugal e da sua
história. Como curiosidade posso dizer que os familiares de Vasco da
Gama são originários
de Olivença e desta forma vamos relembrar esse facto.»
A iniciativa cultural contou com a colaboração do Ayuntamiento de
Olivença, da
Associação para o Desenvolvimento Rural da Comarca de Olivença e da
Junta da Estremadura,
e consistiu ainda num vasto conjunto de actividades, entre as quais se
destacaram peças
de teatro, música, literatura e animação de rua.
Em paralelo, houve uma zona reservada a exposições, onde estiveram
artesãos, um
espaço dedicado à gastronomia e a instituições do espaço lusófono, bem
como trabalhos ao
vivo e animação musical a cargo de grupos de Portel (Évora).
Procedeu-se a uma leitura pública contínua em português, na qual
participaram
oliventinos de todas as idades lendo ou recitando na língua de Camões,
Este foi um dos
pontos altos que a organização destaca deste dia dedicado ao mundo lusófono.
Durante a manhã ocorreu também uma demonstração de folclore,
através do grupo "La
Encina" de Olivença e a atuação das Cantadeiras de Granja (Évora).
No período da tarde foi projectado no Espácio para la Creación
Joven, o filme "O Leão
da Estrela", e houve actividades de animação nas ruas, bem como ainda
a atuação dos
alunos de português da escola pública Francisco Ortiz, de Olivença.
A "Estória da Galinha e do Ovo" e "O Canto dos Poetas", ambos
interpretados pela
associação "Do Imaginário" de Évora, foram dos atractivos desta
iniciativa promovida pela
associação "Além Guadiana".

UM MERCADO MENSAL

O final de 2010 e o princípio de 2011 viram realizar-se mais uma
iniciativa deste
prolixo grupo oliventino: um mercado mensal de artesanato e
antiguidades portuguesas. O
primeiro efetuou-se a 11 de Dezembro de 2010, o segundo a 8 de Janeiro
de 2011. O terceiro
em 12 de Fevereiro de 2011. E assim por diante!
Pela primeira vez, em mais de duzentos anos, ressurgiu o mercado
antigo tradicional de
Olivença era aos Sábados, nas suas características originais. Na
verdade, este evento
efetua-se num local distinto do mercado mais convencional (Adro da
Igreja manuelina da
Madalena), que é no mesmo dia da semana.
Foi curiosa a primeira edição, não só pelo afluxo de interessados,
mas também por
algumas das motivações expressas. Muitas louças tradicionais (do
Redondo, por exemplo), e
mobiliário, também tradicional, foram adquiridos porque lembrava aos
compradores objectos
vistos em casa de antepassados seus, onde constituíam uma espécie de
relíquias. Note-se
que, na falta do seu tradicional mercado, muitos oliventinos, durante
mais de cem anos,
se deslocavam a Elvas ou a outras localidades, procurando obter os
produtos (então de
utilidade doméstica, ou de decoração) a que estavam tradicionalmente
habituados.

LANÇAMENTO DAS SEGUNDAS LUSOFONIAS NA "CASA O ALENTEJO" (12-Maio dwe 2011)

O Além Guadiana" não hesitou em avançar para uma nova edição de
Lusofonias, e tratou de fazer a sua divulgação na "Casa do Alentejo",
em 12 de Maio de 2011. A Imprensa portuguesa, ainda que convocada, não
compareceu em grande medida, cm excepção da Agência Lusa, que publicou
um excelente artigo sobre este grupo de oliventinos. São dessa
notícias as informações que se seguem.
«A associação 'Além Guadiana' apelou hoje a um maior apoio do
Estado português e das diversas instituições ligadas à cultura, para
"manter acesa a
chama" da língua portuguesa em Olivença.
"Falta apoio português. Não só do Estado, mas também das instituições
e dos media. Os
meios de comunicação social portugueses deveriam ir a Olivença ver as
coisas de outro
prisma", afirmou Eduardo Machado, que aproveitou para sublinhar que o
'terreno' da
associação "é apenas a cultura".
"Queremos tratar as coisas com naturalidade. Respeitamos todas as
posições, mas o nosso
terreno é a cultura", afirmou, referindo-se às rivalidades e preconceitos ainda
existentes e à necessária mudança de mentalidades, sublinhando: "O
português em Olivença
não é uma língua estrangeira".
O responsável falava na primeira iniciativa pública da 'Além Guadiana'
em Portugal, que
decorreu na Casa do Alentejo, em Lisboa, e serviu não só para fazer um
balanço dos três
anos de atividades desta associação sem fins lucrativos mas também
para apresentar a
segunda edição do festival 'Lusofonias', que decorrerá em Olivença nos
dias 28 e 29 deste
mês.» (Fim da citação da Lusa).
E, na verdade, o novo festival de Lusofonias, de dois dias,
decorreu em 28 e 29 de Maio de 2011. (CONTINUA)

O SEGUNDO FESTIVAL DE LUSOFONIAS (28 e 29 de Maio de 2011)

Teremos de fazer algumas considerações prévias, ainda que com o
risco de cair em "repetições".
É difícil descrever o que representou, ou representa, histórica e
culturalmente, este
"festival" de cultura portuguesa e lusófona para, e em primeiro lugar,
Olivença, para Portugal, e para o espaço lusófono. Trata-se, recordemos, do
renascer de toda uma Cultura (a portuguesa) num lugar onde, desde
1801, a mesma deixou de ser "oficial", e onde, durante cerca de
duzentos anos, muito se fez para a aniquilar. São habitantes locais,
oliventinos genuínos, que, sem entrarem em considerações politicas e
considerações sobre litígios de soberania, reivindicam a sua cultura
tradicional e a sua pertença ao espaço lusófono. É um tanto
confrangedor, para não usar expressões mais críticas que não se dê
maior destaque ao que ali ocorre em consequência disso.
No dia 28 de Maio, Sábado, após uma alocução das autoridades locais
(com a presença de todas as forças políticas oliventinas) numa curta
cerimónia de abertura, as "Lusofonias" foram oficialmente abertas ao
público. Pavilhões de instituições portuguesas e de comércio e
artesanato (com destaque para a doçaria), que se estendiam por duas
secções da antiga Carreira, numa amostra muito significativa da
cultura portuguesa. O grupo Gigabombos, de Évora, desfilou no local,
e, depois, por toda a cidade.
Seguiu-se uma leitura pública, essencialmente por oliventinos, de
textos em Português. Documentários e teatro, música, corais
alentejanos, bem como actuações de escolas locais (sempre ne língua de
Camões), seguiram-se pela noite fora. Note-se que estavam presentes
elementos culturais de vários países lusófonos, e não só de Portugal.
Uma exposição fotográfica, aliás apresentada com destaque, mereceu
muita atenção, intitulada "O meu olhar sobre a Olivença Portuguesa",
do oliventino Jesus Valério. Muita gente a elogiou.
À noite, houve um espectáculo público, um concerto do cantautor
espanhol (e extremenho) Luís Pastor, "padrinho" do evento, que teve o
cuidado de quase só usar a língua portuguesa, cantando temas
portugueses, e recordando grandes cantautores portugueses (a começar
por Zeca Afonso).
No dia 29 de Maio, Domingo, reabriu o espaço dos pavilhões, e actuou o
Rancho folclórico de Macieira da Lixa (Porto). Seguiram-se canções e
dramatizações, uma vez mais em Português e a "cargo" de alunos de
escolas locais, e ainda mais música por um grupo português. Só por
volta das 24.00 se deu por encerrado o evento, um sucesso que levará,
decerto, a Associação oliventina "Além Guadiana" a continuar a
esforçar-se por devolver a Olivença a sua cultura e língua
tradicionais, com iniciativas como esta ou outras similares, para além
de um trabalho contínuo e diário nesse mesmo sentido.
A dita Associação renova o apelo para que, em Portugal, e sem
preconceitos, haja uma maior divulgação das suas actividades, bem como
apoios, basicamente culturais, já que os seus objectivos são deste
teor, e não outros. É infelizmente necessário repetir que nem sempre
parece estar a haver uma clara
compreensão destes aspectos, o que muito se lamenta.

INTEGRAÇÃO NA LUSOFONIA

Só no dia 8 de Junho de 2011 a RTP, no "Portugal em Directo",
mostrou a boa reportagem que fizera em Olivença no dia 28 de Maio de
2011. Sirva de desculpa o período eleitoral que se vivia então em
Portugal. Afinal, os oliventinos só querem ser ouvidos, sem
discriminações.
"A língua de Camões fala-se ininterrompidamente em Olivença desde
finais do século
XIII". Estas são palvras do Presidente da Associação Além Guadiana, o
já citado Joaquín
Fuentes Becerra, "Este o mais importante legado português. Até meados
do século XX, 150
anos após a mudança de nacionalidade, a língua maioritária era o
Português, apesar de não
ter tido qualquer apoio institucional". Becerra acrescenta que, hoje
em dia, para além de
conservada pelos mais velhos, a língua portuguesa já está a ser
ensinada nas escolas.
"Estamos no caminho correto, mas faz falta uma aposta mais forte para
que a língua
portuguesa não se perca em Olivença. A língua é tudo". E, sem abordar
aspectos políticos,
Becerra reclama para a localidade a sua "INTEGRAÇÃO NA LUSOFONIA".
Parece que algo de novo, e talvez um tanto inesperado, está a
surgir no espaço
lusófono. Ignorá-lo, fingir que não existe, começa a ser impossível. E
insuportável!
Estremoz, 16 de Junho de 2011
Carlos Eduardo da Cruz Luna (FIM)

(TEXTO COLOCADO NO GRUPO ALENTEJANOS NO FACEBOOK PELO DR. CARLOS EDUARDO DA CRUZ LUNA)