sábado, 5 de março de 2011

Cante Alentejano - IV - vídeo Dailymotion

Cante Alentejano - III - vídeo Dailymotion

Cante Alentejano - II - vídeo Dailymotion

Cante Alentejano - I - vídeo Dailymotion

O CANTE ALENTEJANO - ENVIADO POR CANTADEIRAS ALMA ALENTEJANA



Cantadeiras Alma Alentejana

E se o Cante Alentejano fosse de origem Judaica? Ora aprecie...
O Alentejo não tem fim!
RUA DA JUDIARIA

Colocado no Facebook em 02 de Março de 2011 - 23:37




Encontrámos no Blog Rua da Judiaria o seguinte:

"Raiz judaica do Cantar Alentejano…
Published by Nuno Guerreiro Josué at 10/19/2007 in músicas da judiaria.


Sempre ouvi dizer que as raízes dos cantares tradicionais alentejanos eram árabes, e que remontavam aos séculos de domínio muçulmano do Sul de Portugal mas, confesso, e apesar de conhecer bastante música árabe, nunca encontrara entre elas qualquer analogia. Inclusive, alguma tentativas de aproximação entre as duas empreendidas por músicos contemporâneos, apesar de agradáveis, tinham sempre um sabor a casamento forçado.
Curiosamente, foi nas sinagogas sefarditas que encontrei melodias que me faziam de imediato lembrar as “modas” alentejanas das terras dos meus país.
As semelhanças encontram-se no todo, mas elas notam-se principalmente em pontos de contacto muito específico – o maior dos quais a sua forma “responsiva”, pois tanto na oração judaica como no cantar tradicional alentejano há um “líder” e um coro que responde. Mas é a forma como essa relação, esse diálogo melódico, se desenrola que parece deixar pouca margem para dúvidas acerca da evidente afinidade."



COMENTÁRIOS NO FACEBOOK:

Luis Milhano Mais um contributo valioso para "entender" o CANTE ALENTEJANO".
Obrigado Amigas Cantadeiras Alma Alentejana.
O Amigo José Borralho já tinha referido este blog mas eu não o encontrara e foi bom este link.
Quarta-feira às 23:55

Filomena Barata Obrigada amigas!
quinta-feira às 0:07

José Borralho Todos os estudos sérios sobre qualquer tema são lícitos. O apriorismo, chegar à tese antes da análise pode ser um embuste!
quinta-feira às 0:17

quarta-feira, 2 de março de 2011

O CANTE ALENTEJANO - ENVIADO POR ISAURINDO SEMPÃO



Isaurindo Sempao Até onde remontam as origens de “cante”?

Como sabe, existem três vias para dar resposta a essa dúvida que nos surge sempre que queremos encontrar o momento, o local e o modo do surgimento do cante alentejano. Estudiosos da matéria apontam a génese do cante para a pratica coralista gregoriana, encontrando razões, pontos de convergência e similitudes que para eles são irrefutáveis. Outros, igualmente empenhados no estudo desta matéria, avançam como resposta a herança histórico-cultural legada pela presença árabe no nosso país e a sua abalada mais tardia do sul do país. Buscando e encontrando semelhanças, na forma de expressão vocal nossa e no cante mourisco….

Mas, outros há ainda que respondendo à mesma questão, negam ambas as explicações anteriores e apontam como fundamento da origem do cante alentejano a fixação pelas nossas gentes e a sua interpretação sistemática, de uma forma de polifonia onde se concentram e se exteriorizam os valores mais profundos da alma deste povo.

E quais as suas estruturas?

No seu início, o cante tinha como palco o campo. Foi uma necessidade sentida pelos trabalhadores para lhes aconchegar o espírito e lhes aliviar o corpo. Nasceu nas idas e nas vindas do trabalho e cultivou-se na dureza da azáfama.

O cante nasceu em função do trabalho, burilou-se na sua execução, passou a ser instrumento do mesmo.

Depois prolongou-se caminhos fora e entrou nas vilas e nas aldeias. Continuou-se nas tabernas, apareceu nas festas.

Mas a sua função principal não era animar os folguedos. Nasceu da necessidade dos trabalhadores inventarem um bálsamo para as suas dores tantas.

E o cante era isso, um grito que aliviava, um suspiro que tornava menos amarga a dureza da vida.

O cante colectivo, o som projectado por tanta garganta em uníssono, dava uma sensação de força maior, que se acrescentava à outra que a fraqueza ia vencendo, quer debaixo do sol escaldante, quer sob uma qualquer intempérie para a qual não havia abrigo de jeito.

No trabalho esforçado para além dos limites das posses individuais, valia assim a presença do coro colectivo que emprestava ânimo e ajudava, no seu cadenciado, a vencer mares de searas.

Tudo se formava e tudo se dissolvia na ida e com o regresso das labutas, onde homens, mulheres e crianças marchavam juntos durante quilómetros.

Era essa a escola, era essa a vida do cante.

Só mais tarde, a partir da década de trinta, dentro das vilas, é que os Grupos corais começaram a ter alguma consistência organizativa.

Em torno da figura de um bom cantador, começaram a esboçar-se os Grupos Corais que temos hoje. Com disciplina de posições, com organização e ensaios.

A mulher começa a aparecer no “cante”. A que se deve tal facto? A mulher também faz parte da tradição?

Como atrás dissemos, as mulheres estiveram na génese do cante, lado a lado com os homens. Ombreavam no trabalho e aí, podiam cantar e cantavam juntos.

Mas a sequencia, digamos que urbana do cante, privou, durante décadas, as mulheres de assumirem o seu papel como intérpretes de uma “moda” que também era sua.

Dado o seu estatuto Sócio-Cultural, não frequentavam os lugares onde o cante se prolongou depois de desaparecer dos campos, afastado pela mecanização da agricultura. Por isso, só por isso, durante tanto tempo se fez o silêncio nas gargantas femininas.

Mais tarde veio Abril e pouco a pouco foram-se abrindo os corações das mulheres para o cante, à medida que se iam também abrindo os horizontes dos seus direitos e as suas possibilidades de movimentação dentro do tecido social.

Dizem-me que o cante nunca cantou a política. E quais eram os temas cantados?

Antes de 74 o cante não podia abordar a temática política Algumas modas, porque as houve, mais ousadas eram proibidas e os seus interpretes castigados. Neste país, mesmo com fome não se podia gritar por pão. Mesmo tolhidos, não podiam clamar por liberdade. Assim, as modas, feitas e divulgadas nessa época, na sua generalidade, cantavam a vida, a contemplação, a nostalgia, o amor, a saudade, o trabalho, tinham uma função mais de expiação das mágoas do que de reivindicação de melhor sorte.

Logo a seguir ao 25 de Abril, o cante e os corais foram notoriamente instrumentalizados para “enfeitarem” manifestações e comícios e as letras das modas, por essa via, sofreram, como não podia deixar de ser, durante algum tempo as influências diretas do momento político efervescente, reivindicativo e até quase conspirativo da altura, como nas modas “morreu Catarina, era comunista” e “oh reforma agrária, eu sonhei contigo...”.

Mas depressa os Grupos retomaram o cancioneiro popular, continuando a cantar as modas que falavam da vida, da sua vida, do campo e da nostalgia de tempos idos, como na moda, “lembra-me o tempo passado, tudo se vai acabando, o boi puxando o arado e o almocreve cantando…”.

São muitos os grupos de cante que existem na cintura de Lisboa. Quer avaliar este fenómeno?

Com a diáspora, embora tardia, dos alentejanos para fora da sua terra, levaram consigo a crença pelo cante e a falta que do mesmo também sentiam. O cante era para eles uma espécie de colo onde se embalavam com as suas contrariedades para amenizarem o viver. Sem ele, mesmo longe, não podiam viver. Ainda por cima, se lhes acrescentou a saudade, fazedora de angústias.

Daí que por toda a Grande Lisboa, onde poisaram, deram seguimento ao seu sentir rural, e cantaram. Mas só cantando juntos surtia o efeito desejado. E assim nasceram, vários, muitos grupos corais, prenhes de ruralismo, em zonas eminentemente industriais.

Qual a influência, positiva ou negativa, do 25 de Abril no “cante”?

Julgamos que o 25 de Abril, libertando o povo de amarras e opressões, só podia ter influencia positiva em toda o seu existir. E o cante é uma expressão dessa mesma existência.

Todavia, com as influências da intromissão abusiva e não criteriosa da política activa nos corais, as coisas tremeram.

Lino Mendes

Colocado no Facebook Quarta-feira às 17:55





COMENTÁRIOS NO FACEBOOK:

Isaurindo Sempao espero que tenha contribuido para chegar-mos onde e como começou o cante alentejano, obrigado
Quarta-feira às 17:57

Luis Milhano Amigo Isaurindo, agradeço ter colaborado com o nosso Grupo. No entanto lembro que o texto de Lino Mendes também foi publicado nesta página.
Todos os contributos são importantes para estudarmos assuntos do nosso Alentejo.
Um abraço
Quarta-feira às 19:04

O CANTE ALENTEJANO - Por HERNÂNI MATOS


Hernâni Matos O CANTE ALENTEJANO

Do BLOG DO TEMPO DA OUTRA SENHORA
A identidade cultural do povo alentejano tem a ver com o cante, que segundo a tese litúrgica do padre António Marvão teve origem em escolas de canto popular fundadas em Serpa, por monges paulistas do Convento da Serra d’Ossa, os quais tinham formação em canto polifónico.

Colocado no facebook em 02 de Março de 2011




Fomos espreitar o blog do Amigo Hernâni Matos e recolhemos mais um pouco sobre este tema e até lhe trouxemos o Grupo de Cantadores.


Grupo de Cantadores
(criação da barrista Ana Bossa - Estremoz)

A identidade cultural do povo alentejano tem a ver com o cante, que segundo a tese litúrgica do padre António Marvão teve origem em escolas de canto popular fundadas em Serpa, por monges paulistas do Convento da Serra d’Ossa, os quais tinham formação em canto polifónico.
No "Cancioneiro Alentejano" – recolha de Victor Santos, diz Fernando Lopes Graça:
“O alentejano canta com verdadeira paixão e todas as ocasiões lhe são boas para dar largas ao seu lirismo ingénito. Não há trabalho, folga, festa ou reunião de qualquer espécie, sem um rosário infindo de cantigas.”
Manuel Ribeiro na "Lembrança dos Cantadores da Aldeia Nova de São Bento, Mértola, Vidigueira e Vila Verde de Ficalho", diz-nos:
“Só no Alentejo há o culto popular do canto. Ali se criou o tipo original do “cantador”. Pelas esquinas, altas horas, embuçados nas fartas mantas, agrupam-se os homens: esmorece a conversa, faz-se silencio e de subito, expontâneamente, rompe um coral. É o diálogo em que eles melhor se entendem, é a conversa em que todos estão de acôrdo.
Quem não viu em Beja, em certas ruas lôbregas, em certos recantos que escondem ainda os antros esfumados das adegas pejadas de negras e ciclopicas talhas mouriscas, quem não viu duas bancadas que se defrontam e donde se eleva um canto entoado, solene e soturno, com o quer que seja da salmodia dum côro de monges?”
Embora possa cantar só, o alentejano canta sobretudo em coros e esse canto é sério, dolente, compenetrado e mesmo solene, porque o alentejano é lento, comedido e contemplativo, por força do Sol escaldante.
O coro une os alentejanos. Como diz Eduardo Teófilo em "Alentejo não tem sombra":
"Há, no entanto, a ligá-los a todos, algo de pró­prio, de indefinidamente próprio e que os torna re­conhecíveis em qualquer lugar em que se encontrem.(...). Todos eles estão marcados a fogo, pelo fogo daquele Sol ardente que, mesmo quando mal brilha, entra nas almas e molda os caracteres, todos eles apresentam o seu rosto cortado por navalhadas de vida e tostados pelas ardências do Sol de Verão, como se vivessem todos, realmente, sem uma sombra a que se abrigar.”
Sobre o cante diz-nos ainda Antunes da Silva em "Terra do nosso pão":
“As cotovias cantam para o céu, tresnoitadas. Os Alentejanos cantam para os horizontes, sonhando. Dessas duas castas melodias nasce a força de um povo!”

Hernâni Matos


COMENTÁRIOS NO FACEBOOK

Luis Milhano ‎"No "Cancioneiro Alentejano" – recolha de Victor Santos, diz Fernando Lopes Graça:
“O alentejano canta com verdadeira paixão e todas as ocasiões lhe são boas para dar largas ao seu lirismo ingénito. Não há trabalho, folga, festa ou reunião de qualquer espécie, sem um rosário infindo de cantigas.”"
Amigo Hernâni, grato pela sua participação neste tema do Cante Alentejano. O seu excelente trabalho de pesquisa transmite-nos o desejo de conhecer mais elementos sobre o assunto.
Irei publicitar junto de outras Páginas do Alentejo os elementos que aqui forem deixados sobre este tema.
Abraço
Quarta-feira às 12:37

Hernâni Matos Obrigado, amigo.
Um grande abraço para si.
Quarta-feira às 12:39

Filomena Barata Obrigada Hernâni e Lúis.
Quarta-feira às 23:27

O CANTE ALENTEJANO - ENVIADO POR JOSÉ BORRALHO




José Borralho ESTE CONTRIBUTO (PESSOAL) À TEMÁTICA DO CANTE, FOI ENTREGUE EM MÃO NO ÚLTIMO CONGRESSO DA MODA EM SERPA, E CERTAMENTE POR LAPSO, FOI IGNORADO PELA MESA QUE DIRIGIA OS TRABALHOS.

O Cante

Muitas são as opiniões suscitadas pelo Cante Alentejano, sejam as suas origens, os seus temas, a sua importância e influência na vida do povo rural.
Há autores que defendem que as fontes do Cante são judaicas, outros que são árabes, outros ainda atribuem as suas origens à influência da Igreja Católica.
Resumindo: segundo estes opinadores, teria vindo de fora o sopro que fez cantar os Alentejanos e Alentejanas. Quanto a mim, estas opiniões não abarcam, e passam ao lado do fundamental do problema, pela razão simples de atribuírem papel de segundo plano ao actor principal, e à sua inserção na realidade concreta, na vivência milenar do povo com seus hábitos e costumes, sua relação com o trabalho, com o sofrimento diário da luta pelo sustento, por um lado, e com a sua forma intrínseca de expressar alegrias, sofrimentos, desilusões e revoltas por outro lado.

É desta realidade envolvente da vida do Povo Alentejano que surge a forma de se expressar através do canto, que encontra na planície o espaço para ouvir o eco das suas emoções poéticas, e que recebe da dureza do trabalho e da forma de exploração acrescida do latifúndio motivos para se encontrar com os outros na sua condição de sem-terra, e com eles partilhar e fundir os mesmos sentimentos através dum canto colectivo.

Se alguém escutar os argumentos dos que atribuem as raízes do Cante ao judaísmo, terá de conter o riso porque o argumento é simplesmente este: "As semelhanças encontram-se no todo, mas elas notam-se principalmente em pontos de contacto muito específico – o maior dos quais a sua forma 'responsiva', pois tanto na oração judaica como no cantar tradicional alentejano há um 'líder' e um coro que responde. Mas é a forma como essa relação, esse diálogo melódico, se desenrola que parece deixar pouca margem para dúvidas acerca da evidente afinidade.”1
Por esta ordem de análise, o mesmo se poderia aplicar nas práticas católicas uma vez que também aí, nas missas cantadas, uma voz começa e as outras respondem, estabelecendo-se dessa forma um diálogo religioso em forma cantada. Mas, o que tem a ver o diálogo religioso praticado nas igrejas e sinagogas com o diálogo multicultural das interrelações entre os membros de uma comunidade, neste caso os Alentejanos?
Pura e simplesmente nada! Nem mesmo na forma.

Porque aqui não há um líder, nem uma entidade divina que evidencie o motivo do canto. Há sim um grupo de indivíduos que, comungando das mesmas alegrias, sofrimentos, amores ou revoltas, à volta de um balcão com vinho, numa feira ou a tratar a terra, assumem as suas afinidades e solicitam do outro a partilha de problemas comuns a todos; as coisas do trabalho, dos animais, da natureza, do amor, e da condição de povo que nada tem de seu: é daqui que vem o sopro do cante Alentejano.

Os alentejanos, tal como qualquer outra comunidade, são influenciáveis pelo conjunto de valores e práticas de outras comunidades e povos. Os factores subjectivos são transversais a todo o tecido social, em maior ou menor grau, dependendo das relações sociais, económicas e culturais dominantes.

É uma realidade indesmentível que os árabes nos deixaram marcas da sua civilização. O modo de vestir das nossas avós, e que ainda hoje encontramos em alguns sítios das nossas aldeias, a tolerância para com os outros, (evidenciada durante a sua permanência entre nós), a calma na resolução dos problemas do quotidiano, o suportar do calor abrasante, e porventura nalguns laivos da nossa maneira de cantar, para não falar da influência das palavras, e dos modos de cultivo e rega. Dos seus preceitos religiosos pouco restou, porque, como é sabido, a religião cristã assumiu-se como dominante, e naturalmente o povo assimilou-a aculturando-se, embora em menor grau que noutras regiões, devido principalmente à quase ausência de propriedade individual.

Mas é forçoso reconhecer que a semelhança do cantar árabe com a forma do cantar alentejano é práticamente inexistente, embora, como salientou Michael Giacometti, as raízes da estrutura musical do Cante mergulhem na musicalidade árabe.
É também de salientar que o cante alentejano alicerça a sua força melódica no coral, no colectivo, enquanto no cantar árabe ressaltam a maviosidade e o brilhantismo da voz individual, parecendo duas formas de cantar distintas uma da outra. Pouco existe em comum entre estas duas formas de cantar.

A força do cante alentejano provém da profundidade dos sentimentos que dele exorbita.
Aqui ficam alguns exemplos da força e da personalidade do Cante Alentejano.

Da condição social:
“ Nós somos trabalhadores que no campo trabalhamos// Trabalhamos ao rigor do nascer até ao pôr para ver se nos mantemos…”

“Há lobos sem ser na serra/eu ainda não sabia/ debaixo do arvoredo/ trabalham com valentia...”

“Muito bem parece um ramo de flores/ pregado no peito dos trabalhadores//dos trabalhadores, dos oficiais/ no meu lindo amor, no meu lindo amor/ ainda brilha mais.

Do trabalho:
“Já morreu o boi capote camarada do pombinho/ quem não for capaz não bote regos ao pé do caminho.”

“Trabalha homem trabalha se queres ter algum valor…”

“Lavro a terra ceifo o trigo/tiro a cortiça aos sobreiros/ também apanho azeitona cantando os dias inteiros”.

Da natureza:
“O sol é que alegra o dia pela manhã quando nasce”…

“Ó água do céu cais pura / já não vais a ter ao mar/ ficas presa na barragem/ que temos em Portugal”…

“Já chove já está chovendo/ já correm os barranquinhos/já os campos estão alegres/ já cantam os passarinhos”…

Do amor:
“Que inveja tens tu das rosas / se és linda como elas são”…

“Só uma pena me existe minha doce saudade/ é olhar para o teu rosto ver-te assim tão pouca idade”…

“Moreninha alentejana quem te fez morena assim/foi o sol da primavera que caía sobre mim”…

Da atitude mística:
“Eu vi minha mãe rezando aos pés da virgem Maria/ era uma santa escutando o que outra santa dizia”…

“Ó águia qe vais tão alta voando de pólo a pólo/ leva-me ao céu aonde eu tenho a mãe que me trouxe ao colo”…

“Quando eu oiço bem cantar paro e tiro o meu chapéu/ não se me dava morrer se houvesse cantes no céu”…

O Cante alentejano constitui sem dúvida uma expressão artística de grande valor na música tradicional do nosso país, porque os alentejanos, ao cantar, não limitam a sua expressão a um momento de divertimento. O Cante expressa os sentimentos belos do amor, as preocupações sociais do colectivo, e de um povo que luta pela dimensão digna de ser humano.
Cabe aos alentejanos lutar para que se mantenha bem viva esta sua forma de expressão.
1(in-blog Rua da Judiaria)

José Fonseca Borralho
24 de Janeiro de 2010


Colocado no facebook em 02-03-2011 às 12:02




COMENTÁRIOS NO FACEBOOK

Luis Milhano ‎"Cabe aos alentejanos lutar para que se mantenha bem viva esta sua forma de expressão."
Grato pela divulgação deste texto, excelente contributo para o conhecimento das origens do cante alentejano.
Quarta-feira às 12:08

Francisco Martins Obrigado amigo Borralho por este magnifico trabalho.
Quarta-feira às 12:17

José Borralho O meu contributo vai no sentido de dar primazia ao factor social -um povo sem terra- e à forma de exploração latifundiária que aproximou o Povo de soluções colectivas, a começar pelo Cante. É possível que o o cantar gregoriano tivesse alguma influência na forma de cantar dos alentejanos, mas, muitos séculos antes de os Frades da Serra d'ossa chegarem ao Baixo Alentejo já o povo manifestava o seu cante:
Quarta-feira às 12:22 ·

Filomena Barata Obrigada José pelo contributo.
Quarta-feira às 23:29

O CANTE ALENTEJANO - Por LINO MENDES



Por LINO MENDES

"Folclore Português

O Cante Alentejano

Foi curioso o despertar do meu interesse pela “Cante”. Nesse dia ao cair da noite o Rancho Folclórico de Montargil ia actuar na Casa do Alentejo (Lisboa). Mas na parte da manhã eu seria um dos participantes num Colóquio cujo tema, tive conhecimento à chegada, seria precisamente…o Cante.

Fiquei naturalmente alarmado já que para isso não tinha conhecimentos. Mas tudo se resolveu, eu acabaria por falar sobre a moda das “saias” também um cantar do Alentejo, que para o Cante lá estava Colaço Ribeiros mestre na matéria, e a partir daí… Demos entretanto a palavra a quem em profundidade sabe do assunto…

O que é, afinal, o cante alentejano?

“O cante alentejano é uma polifonia simples, a duas vozes paralelas, à terceira superior”. “É composto de modas, nas quais sobressaem, nalgumas delas, dois sistemas musicais inteiramente distintos; o sistema modal e o sistema tonal. O sistema modal, em uso durante toda a Idade Média, o sistema tonal, já fruto do Renascimento, no século XVI”

E como se canta?

“Os cantadores, geralmente homens do campo, cantam em grupo, divididas as vozes em três naipes: o Ponto, o Alto e as Segundas vozes. A função do Ponto é iniciar a moda, retornada depôs pelo Alto, e em seguida pelas segundas vozes, constituindo assim o coro. A função específica do Alto é preencher as pausas com os vaias, no fim das frases musicais, excepto na última — assim uma espécie de Ponto na 1 vez”(Padre António Augusto Alfaiate Marvão).

E a partir de agora, passamos a conversar com Colaço Ribeiro

Até onde remontam as origens de “cante”?

Como sabe, existem três vias para dar resposta a essa dúvida que nos surge sempre que queremos encontrar o momento, o local e o modo do surgimento do cante alentejano. Estudiosos da matéria apontam a génese do cante para a pratica coralista gregoriana, encontrando razões, pontos de convergência e similitudes que para eles são irrefutáveis. Outros, igualmente empenhados no estudo desta matéria, avançam como resposta a herança histórico-cultural legada pela presença árabe no nosso país e a sua abalada mais tardia do sul do país. Buscando e encontrando semelhanças, na forma de expressão vocal nossa e no cante mourisco….

Mas, outros há ainda que respondendo à mesma questão, negam ambas as explicações anteriores e apontam como fundamento da origem do cante alentejano a fixação pelas nossas gentes e a sua interpretação sistemática, de uma forma de polifonia onde se concentram e se exteriorizam os valores mais profundos da alma deste povo.

E quais as suas estruturas?

No seu início, o cante tinha como palco o campo. Foi uma necessidade sentida pelos trabalhadores para lhes aconchegar o espírito e lhes aliviar o corpo. Nasceu nas idas e nas vindas do trabalho e cultivou-se na dureza da azáfama.

O cante nasceu em função do trabalho, burilou-se na sua execução, passou a ser instrumento do mesmo.

Depois prolongou-se caminhos fora e entrou nas vilas e nas aldeias. Continuou-se nas tabernas, apareceu nas festas.

Mas a sua função principal não era animar os folguedos. Nasceu da necessidade dos trabalhadores inventarem um bálsamo para as suas dores tantas.

E o cante era isso, um grito que aliviava, um suspiro que tornava menos amarga a dureza da vida.

O cante colectivo, o som projectado por tanta garganta em uníssono, dava uma sensação de força maior, que se acrescentava à outra que a fraqueza ia vencendo, quer debaixo do sol escaldante, quer sob uma qualquer intempérie para a qual não havia abrigo de jeito.

No trabalho esforçado para além dos limites das posses individuais, valia assim a presença do coro colectivo que emprestava ânimo e ajudava, no seu cadenciado, a vencer mares de searas.

Tudo se formava e tudo se dissolvia na ida e com o regresso das labutas, onde homens, mulheres e crianças marchavam juntos durante quilómetros.

Era essa a escola, era essa a vida do cante.

Só mais tarde, a partir da década de trinta, dentro das vilas, é que os Grupos corais começaram a ter alguma consistência organizativa.

Em torno da figura de um bom cantador, começaram a esboçar-se os Grupos Corais que temos hoje. Com disciplina de posições, com organização e ensaios.

A mulher começa a aparecer no “cante”. A que se deve tal facto? A mulher também faz parte da tradição?

Como atrás dissemos, as mulheres estiveram na génese do cante, lado a lado com os homens. Ombreavam no trabalho e aí, podiam cantar e cantavam juntos.

Mas a sequencia, digamos que urbana do cante, privou, durante décadas, as mulheres de assumirem o seu papel como intérpretes de uma “moda” que também era sua.

Dado o seu estatuto Sócio-Cultural, não frequentavam os lugares onde o cante se prolongou depois de desaparecer dos campos, afastado pela mecanização da agricultura. Por isso, só por isso, durante tanto tempo se fez o silêncio nas gargantas femininas.

Mais tarde veio Abril e pouco a pouco foram-se abrindo os corações das mulheres para o cante, à medida que se iam também abrindo os horizontes dos seus direitos e as suas possibilidades de movimentação dentro do tecido social.

Dizem-me que o cante nunca cantou a política. E quais eram os temas cantados?

Antes de 74 o cante não podia abordar a temática política Algumas modas, porque as houve, mais ousadas eram proibidas e os seus interpretes castigados. Neste país, mesmo com fome não se podia gritar por pão. Mesmo tolhidos, não podiam clamar por liberdade. Assim, as modas, feitas e divulgadas nessa época, na sua generalidade, cantavam a vida, a contemplação, a nostalgia, o amor, a saudade, o trabalho, tinham uma função mais de expiação das mágoas do que de reivindicação de melhor sorte.

Logo a seguir ao 25 de Abril, o cante e os corais foram notoriamente instrumentalizados para “enfeitarem” manifestações e comícios e as letras das modas, por essa via, sofreram, como não podia deixar de ser, durante algum tempo as influências diretas do momento político efervescente, reivindicativo e até quase conspirativo da altura, como nas modas “morreu Catarina, era comunista” e “oh reforma agrária, eu sonhei contigo...”.

Mas depressa os Grupos retomaram o cancioneiro popular, continuando a cantar as modas que falavam da vida, da sua vida, do campo e da nostalgia de tempos idos, como na moda, “lembra-me o tempo passado, tudo se vai acabando, o boi puxando o arado e o almocreve cantando…”.

São muitos os grupos de cante que existem na cintura de Lisboa. Quer avaliar este fenómeno?

Com a diáspora, embora tardia, dos alentejanos para fora da sua terra, levaram consigo a crença pelo cante e a falta que do mesmo também sentiam. O cante era para eles uma espécie de colo onde se embalavam com as suas contrariedades para amenizarem o viver. Sem ele, mesmo longe, não podiam viver. Ainda por cima, se lhes acrescentou a saudade, fazedora de angústias.

Daí que por toda a Grande Lisboa, onde poisaram, deram seguimento ao seu sentir rural, e cantaram. Mas só cantando juntos surtia o efeito desejado. E assim nasceram, vários, muitos grupos corais, prenhes de ruralismo, em zonas eminentemente industriais.

Qual a influência, positiva ou negativa, do 25 de Abril no “cante”?

Julgamos que o 25 de Abril, libertando o povo de amarras e opressões, só podia ter influencia positiva em toda o seu existir. E o cante é uma expressão dessa mesma existência.

Todavia, com as influências da intromissão abusiva e não criteriosa da política activa nos corais, as coisas tremeram.

Lino Mendes
De Portugal

Conselheiro Técnico da Associação de Folcloristas do Alto Alentejo e Conselheiro Técnico Regional (Alto Alentejo) da Federação do Folclore Português; Um dos fundadores e, Coordenador Técnico do Rancho Folclórico de Montargil, colaborador do jornal “Folclore”; há mais de 40 anos ligado ao Folclore e escreve para o Mundo Lusíada Online.


In MUNDO LUSÍADA

http://www.mundolusiada.com.br/COLUNAS/ml_coluna_188.htm "

Colocado no Facebook em 02 de Março de 2011





COMENTÁRIOS NO FACEBOOK:


Jose Guerreiro Já agora, como pormenor e com referencia ao texto supra, o respondente a Lino Mendes é Colaço Guerreiro e não Colaço Ribeiros, como por lapso ficou escrito
Quarta-feira às 0:24 ·


Luis Milhano Grato, Amigo José Guerreiro, pela rectificação.
Quarta-feira às 0:28 ·

Cantadeiras Alma Alentejana Já conhecíamos este artigo da sua publicação na Revista da Casa do Alentejo. Mas é sempre oportuno «rever a matéria dada», para mais em vésperas de um grande «exame». Sabemos que todos os olhares vão convergir para a Baixa de Lisboa e Casa do Alentejo. Também prevemos que nos irão apontar «n» falhas de organização, mas como um Grupo unido que somos nada tememos. Temos a confiança dos Grupos que convidámos e dos amigos no Facebook. Obg, vamos naturalmente partilhar. O Alentejo não tem fim!
Quarta-feira às 0:29 ·